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A morte anunciada da agência bancária

por: Afonso Bazolli
em: Opinião
fonte: Valor Econômico
29 de junho de 2015 - 18:07 - atualizado às 21:37

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Por: Luciana Seabr

Em dez anos, o Brasil vai ter nas ruas metade das agências bancárias que tem hoje. E a tendência é que elas sejam cada vez mais raras. Essa é a previsão do australiano Brett King, conhecido no segmento financeiro como o futurista dos bancos. King presta consultoria a instituições financeiras em todo o mundo sobre como a tecnologia vai mudar a relação das pessoas com seus bancos.

As novas gerações só vão ao banco quando são obrigadas. É por isso que as agências vão evoluir para serviços de assistência técnica, onde os clientes irão raramente, quando têm um problema sério em suas contas. De resto, o banco vai estar no celular. Nem mesmo para investir, o olho no olho será necessário. O cliente diz o prazo e quanto quer ganhar e o algoritmo faz a alocação. Haverá uma divisão entre estruturação, mais regulada e realizada por bancos como os de hoje, e distribuição, em que a experiência do cliente será on-line e poderá ser feita por novas empresas de tecnologia, disse King em entrevista exclusiva ao Valor.

O último livro de King, “Breaking Banks”, ficou entre os três mais vendidos da Amazon nos EUA, na França, no Canadá, na Alemanha e na Austrália. Há quatro anos, ele criou um dos primeiros bancos digitais americanos, o Moven. Nada de agências, gerentes, tudo no celular. King conta já ter tido conversas com Itaú e Bradesco para fazer uma parceria no Brasil. Ele esteve no país neste mês para palestrar na Expert 2015, conferência que reuniu 1,5 mil profissionais e agentes autônomos da XP em Atibaia. Veja a seguir os principais trechos da conversa.

Valor: Como vão ser, para você, os bancos do futuro?

Brett King: A principal diferença é que o banco vai se tornar tecnologia em primeiro lugar e banco em segundo. Não se tratam mais de canais e produtos, mas de clientes e experiências. O desafio para a maior parte dos bancos do mundo que são competidores estabelecidos é que a forma que têm entregado produtos até agora é em agências. No Reino Unido, nos Estados Unidos e na Austrália, as pessoas vão à agência somente uma vez por ano e em geral porque o banco diz que é necessário. Elas não querem mais ir à agência e dizem: por que não posso fazer pelo meu celular?

Valor: Quanto tempo falta para essa mudança?

King: Globalmente, são investidos cerca de US$ 3 trilhões por ano em imóveis e pessoal para agências. Vai levar um tempo para mudar. Uma grande quantidade de investimentos em dispositivos móveis acontece agora, mas os antigos sistemas dos bancos não foram construídos para ser tempo real. Os bancos inteligentes começaram a substituir seus sistemas legais poucos anos atrás, mas é um trabalho gigante. É por isso que companhias que não têm esse legado e estão vindo com novas tecnologias têm vantagem. Elas não têm que substituir o antigo para serem viáveis. Estamos falando de serviços como M-Pesa e Paypal, com mais de um bilhão de pessoas fazendo transações por celular dia a dia. E essa é a mais rápida mudança em modalidade de pagamento que já vimos na história.

Valor: Você defende que a tecnologia traz mais eficiência. Mas, em um primeiro momento, os investimentos são vultosos?

King: Na Moven, já investimos US$ 12 milhões e estamos prestes a investir outros US$ 12 milhões. Não é barato e, diferentemente de outras companhias de tecnologia, como Facebook ou Whatsapp, se eu quero ir para um novo país no serviço bancário, tenho que observar regulamentações diferentes. É por isso que decidimos ter parceiros bancários em cada país, no lugar de tentar crescer sozinhos. Acredito que um dos caminhos que vai emergir é o de novas companhias, lidando com os clientes por meio dos dispositivos móveis, conectados a bancos.

Valor: E no futuro só vão ficar as companhias de tecnologia?

King: Possivelmente. Ou talvez os grandes bancos vão adquiri-las. Vimos recentemente o BBVA comprar a startup Simple [que oferece serviços bancários on-line] por US$ 117 milhões. Isso vai se tornar mais e mais comum. Os bancos vão perceber que, se quiserem construir essa tecnologia sozinhos, isso vai tomar deles muito mais tempo e dinheiro do que a aquisição de uma startup. Ao longo do tempo, a tendência vai ser separar distribuição e estruturação em duas camadas. A distribuição vai ser por telefone e outros dispositivos móveis. Os produtos, o risco e a regulação vão estar por trás. A experiência não vai ser tão regulada quanto a estruturação.

Valor: Essa evolução não esbarra no acesso da população a dispositivos móveis?

King: Na África, 30 países já têm mais contas em bancos on-line do que em bancos físicos. Nos próximos dez anos, vamos bancarizar 2 bilhões de pessoas por meio do celular. Os bancos acham difícil pensar assim. Eles pensam: as pessoas querem ir às agências, vamos construir mais. Uma vila muito pobre do Quênia, por exemplo, tem um único celular para todos. Lá o SIM Card é a nova conta bancária. Eles tiram o chip do telefone e guardam na meia. E assim também se protegem dos roubos.

Valor: Você defende o fim das transações em papel. Mas o próprio dinheiro é papel…

King: Começamos a ver economias do nordeste da Europa, como Finlândia, Suécia, Noruega, Dinamarca e Reino Unido, em que pagamentos eletrônicos superaram as transações em dinheiro, que são muito poucas. No Reino Unido, 80% dos pagamentos em dinheiro são de menos de 20 pounds [próximo de R$ 100]. As pessoas não estão mais fazendo grandes compras em dinheiro. E a razão para fazerem pequenos pagamentos é que é mais fácil, mais rápido. Uma vez que se tornar mais rápido usar o telefone, penso que isso vai mudar. E o diferencial do telefone é que você vai pode ver seu orçamento antes e depois da transação. O cartão e o dinheiro não te dão nenhuma informação.

Valor: Na Moven, os gastos são categorizados e o aplicativo muda de cor quando se gasta mais do que a média histórica. Existe um papel de ajudar na educação financeira?

King: A maior parte da educação financeira foi desenhada para você entender o sistema bancário. E se nós simplesmente fizermos disso uma ferramenta? Costumávamos usar um sistema de planejamento em envelopes. Tinha o envelope do aluguel, o da escola, o da saúde. Depois começamos a digitalizar os envelopes, como no Excel. Mas as pessoas que são bem-sucedidas usando essa tecnologia são as disciplinadas. E a maioria das pessoas é indisciplinada. O que nós decidimos foi: vamos fazer de uma forma em que não seja necessária qualquer disciplina. Fizemos de poupar um jogo, que consiste em: gaste menos hoje do que você gastou ontem. Se você gasta menos, é bom, fica verde. Se gasta mais, é ruim, fica vermelho.

Valor: O futuro então são mesmo ruas sem agências bancárias?

King: Vão restar poucas. Mas, em cinco anos, por que você iria ao banco? Porque não pode manejar seu dinheiro pelo telefone, alguma coisa está errada. Assim como você diz ‘Meu iPhone não está funcionando’, vai dizer ‘Minha conta bancária não está funcionando’. Você não vai ao banco abrir uma conta bancária. Em 2020, você vai fazer isso pelo telefone.

Valor: Nem para a consultoria o olho no olho é necessário?

King: Existe uma psicologia quando se trata de dinheiro. Se ocorre um problema e não posso ter acesso a meu dinheiro, quero falar com alguém. Mas até isso pode ser por vídeo. A marca de confiança e o serviço para resolver o problema é que são chave. No passado, as pessoas necessitavam ter uma agência onde pudessem ver alguém que resolveria o problema. Mas os Millennials [nascidos a partir dos anos 80 até meados da década de 90] tornam isso simples: como eu posso ter meu problema resolvido? Penso que o número de agências que você vai ter em um país como o Brasil vai ser a metade do que se tem hoje até a metade da próxima década. E as agências restantes vão ser menores. Talvez uma agência bancária seja duas pessoas com um iPad

Valor: Como seria o processo de investimento nesse novo mundo?

King: Mais pessoas vão buscar um percentual de retorno. Eles vão dizer: quero 5%, 15% ou 30% de retorno. E o algoritmo do aplicativo vai dizer: 30% é muito arriscado, você está preparado para isso? E depois você vai deixar o algoritmo decidir que investimentos vai fazer. Você não vai ter que escolher produtos ou classes de ativos específicos, vai dizer: quero investir por três meses e quero 5% por meu dinheiro.

Valor: E o papel dos consultores?

King: Quem quiser investimento simples vai fazer por aplicativo. Para os mais complexos, vai buscar a consultoria. Mas a execução vai envolver tecnologia. Metade da consultoria vai ser como fazer isso, que aplicativo ou sistema você tem que usar.

Valor: E como fica a segurança da informação?

King: A assinatura não é mais proteção. Se alguém pegar seu cartão, pode usar, mas, se tomar seu telefone, a primeira coisa que precisa é de uma senha ou da impressão digital. Muitos anos atrás, quando a internet chegou, as pessoas estavam muito temerosas de usar cartão de crédito on-line. E, de repente, as pessoas acham seguro. Penso que a mesma coisa vai acontecer com pagamentos on-line.

Valor: Mas tem ainda a preocupação sobre privacidade.

King: Temos que esperar que nossa privacidade seja um pouco menor do que antes. Posso entrar no Facebook e ver onde você mora, o nome da sua mãe. Temos que pensar sobre segurança de forma diferente. No futuro, a empresa vai dizer: se você me der sua informação pessoal e compartilhar sua localização, então vou te dar um desconto ou um benefício. Vai ser uma escolha: quanto de informação eu dou e o que eu tenho em troca. As companhias espertas vão negociar as informações.

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1 Comentário
  1. É o fim

    carlos damarindo em 24 de outubro de 2016 - 10:59

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