Por: Erdel Santos
Não raramente, notando o comportamento de algumas pessoas próximas, dentre os mais diversos âmbitos de suas vidas, percebo que essas fazem de tudo para não se expor ou se indispor com determinados assuntos delicados que possam gerar conflitos ou que signifique risco a própria imagem e a suas relações.
Sabem aquele tipo de pessoa que você olha e pensa : Nossa, alguém teria que ser muito esforçado para poder discutir com “fulano de tal” ? Você deve conhecer alguém assim.
Bom é sobre eles que falaremos hoje. Não especificamente a pessoa mas a condição efetiva que esse comportamento pode gerar no meio corporativo, quando em excesso.
- Como um filósofo contemporâneo disse: O desnecessário excesso!
Esse tipo de comportamento – de se evitar o conflito – pode até dar uma sensação de tranqüilidade, leveza, e serenidade por um tempo. Mas tudo tem um prazo de validade para terminar e um preço que pode ser alto, a ser cobrado.
Em geral essas pessoas guardam dentro de si as suas opiniões e optam por navegar em meio à política de convívio do: “deixa a vida me levar”.
Essa “navegação” é um prato cheio em um “mar revolto de formadores de opiniões” bem ao modo do “quem grita mais, chora menos” – ou seja, aqueles que não perdem nem se abstêm de expor suas opiniões mesmo que geradoras de conflitos – lucrando na passividade dos inertes que não vão ao embate, mas optam por seguirem a maré.
Importante mencionar que, os formadores de opinião entendem facilmente o processo do: quem grita mais toca “a boiada”… e assim o fazem, gritando, gesticulando, exaltados e inflamados.
Do lado oposto desse cabo de guerra, dentro do meio corporativo, ser um profissional de difícil convivência atualmente não é recomendável. Haja vista o quanto se tem falado ultimamente a respeito de Q.E. ( Quoeficiente Emocional ) e também o quanto as empresas tem buscado profissionais de perfil agregador e conciliadores.
Vale dizer, que se repararmos na composição dos Curriculuns que circulavam na década de 90 e os que circulam agora, dentre algumas diferenças observadas neles, uma delas nítida é que os atuais apontam o RELACIONAMENTO INTERPESSOAL, como ponto importante a ser mencionado no profile.
Em um extremo temos a idéia de boa convivência mesmo que essa custe o embargo das suas opiniões que possam gerar conflitos, já do outro lado a idéia de ser uma pessoa que expõe opinião correndo o risco de ser vista como um desagregador do ambiente…
Em ambos os casos o preço que se paga por uma palavra mal encaixada, ou “maldita” se me permitem o trocadilho, ou mesmo por um problema de saúde relacionado ao trabalho e aos “sapos” que se engolem com o mesmo, é muito, muito alto.
- Você quer deixar um legado ruim com sua má fama interpessoal ? ou quer herdar um mal legado que impacte a sua saúde ?
Óbvio que a melhor opção é nenhuma coisa, nem outra.
Como sobreviver a esse emaranhado de situações do dia a dia que nos tentam a optar por um ou por outro comportamento? Escolhi um exemplo na história para ilustrar uma das maneiras de sobrevivência viável para nós.
E pur se muove – lendária frase atribuída a Galileu Galilei quando do seu julgamento pela cúpula da inquisição, praticamente forçando-o a renunciar a sua descoberta baseada em Nicolau Copérnico, sobre a teoria heliocêntrica: movimento da Terra em torno do Sol.
Vejam trechos da Carta de Abjuração (repúdio/negação) dita e redigida pelo próprio Galileu Galilei em 22 de junho de 1633, em Roma:
“Eu, Galileu Galilei, filho do finado Vincenzio Galilei de Florença, com setenta anos de idade, vindo pessoalmente ao julgamento e me ajoelhando diante de vós Eminentíssimos e Reverendíssimos Cardeais, Inquisidores Gerais da República Cristã Universal…”
e “…fui aconselhado, por este Ofício, a abandonar totalmente a falsa opinião que sustenta que o Sol é o centro do mundo e que é imóvel, e proibido de sustentar, defender ou ensinar a falsa doutrina de qualquer modo…”
ainda “…ou seja porque mantive e acreditei na opinião que diz que o Sol é o centro do mundo e está imóvel, e que a Terra não é o centro e se move, desejo retirar esta suspeição da mente de vossas Eminências e de qualquer Católico Cristão, que com razão era feita a meu respeito…”
Caso o leitor se interesse em ver a Carta Completa entre no link : http://ferrao.org/2008/03/galileu-galilei-e-pur-si-muove.html
Observando o texto completo da Carta de Galileu, percebe-se que ele realmente ajoelhou diante dos inquisidores e, fundamentalmente negou ser um herege.
Este é o ponto, ele negou ser um herege… mas não descreu da sua Teoria.
Inclusive no texto da sua carta, alguns trechos apontam isso. Por exemplo, em vermelho ele expõe claramente sua posição, com sutileza e até detalhes técnicos “…o sol é o centro do mundo e está imóvel, e que a Terra não é o centro e se move…”
Sei bem que um texto, sem contexto, gera um pretexto. Mas a biografia do próprio Galileu que morreu em 1642, exilado em sua casa, aponta para essa convicção.
Utilizei esse exemplo, por que penso que se encaixa bem no nosso tema. A frase de Galileu “E ppur si muove” (e no entanto ela se move, ou contudo ela se move), atribuída a ele ao final da sua sentença, quando já fora do reduto dos inquisidores, diz muito.
Ou seja, Galileu nos mostra como recuar quando necessário não se expondo se isso resultar em perda da nossa “cabeça” ou “assar a nossa carne na Santa Fogueira”. Mas ao mesmo tempo, manter firme nossa convicção e ações, trabalhando para consolidá-las.
Ainda na biografia de Galileu, houve outros livros que ele escreveu e que não foram datados, justamente por receio que sua família ou ele próprio pudesse sofrer represália pelo Poder Dominante da época, que sentia-se afrontado. Isso prova que ele se manteve confiante e convicto na sua posição. (a) vide rodapé deste texto
Desfecho da história: 350 anos mais tarde, em 1983 o Papa Joao Paulo II absolveu a Galileu Galilei da sua acusação de escritos e publicação de doutrinas hereges. (b) vide rodapé
O astrônomo, matemático e cientista em sua biografia, me faz refletir que:
- Calou-se quando deveria, e falou quando ( o que e com quem ) poderia falar.
Esse tipo de sensibilidade que devemos ter. Saber quando e como nos pronunciar. Sentir o ambiente em que estamos e ir além – visualizando o que poderá ocorrer quando nos pronunciarmos de uma ou de outra forma.
Esse exercício poderá nos poupar riscos desnecessários assim como poupará úlceras por guardarmos nossas convicções e soterrarmos nossa personalidade e vontades.
Nossas crenças e nossa ética não podem ser afogadas por “poderes inquisidores” e inibidores. Devemos deixar claras nossas posições e convicções, sempre com respeito, cuidado e empatia pela opinião alheia… principalmente quanto a opinião alheia advir de alguém que poderá “nos condenar à fogueira”.
“As idéias devem brigar, nós não.” – é um ditado que nem sempre está claro para seu interlocutor.
Por isso muito cuidado ao entrar em uma discussão com pessoas que poderão tornar a convivência mais difícil, se cristalizarem a sua simples opinião discordante a respeito de um tema, como algo pessoal e ofensivo.
Portanto, se bem calibrado e ajustado o momento de se calar e de se expor; medidos os riscos de ambos; exposta a opinião com clareza e respeito; você seguiu o roteiro e fez a sua parte.
Mas, caso sua opinião não seja considerada e você continue a acreditar que está no caminho certo, lembre-se de Galileu – recue e saia de cena…
Mas, para sentir-se aliviado por ter sido de voto vencido, eu sugiro a você que diga sozinho onde estiver e já fora de cena : E ppur si muove.
(a) Em 1638, quando já estava completamente cego, publicou Discorsi e Dimostrazioni Matematiche Intorno a Due Nuove Scienze em Leiden, na Holanda, a sua obra mais importante. Nela discute as leis do movimento e a estrutura da matéria.
(b) Em 1983 o Papa Joao Paulo II absolveu a Galileu Galilei sob a acusação de herege, indicando em seu enunciado inclusive que a Igreja havia cometido um engano ao avaliar o caso.
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Caro Erdel, agradeço demais suas palavras. Esse texto caiu para mim como um bálsamo e reflexão a minha inteligência emocional . Sinto apenas pelo fato de ler outros artigos seus e não encontrar mais deles! Estou procurando corretamente ou você só escreveu mesmo esses no passado . Grato pelo excelente conching como já disseram em outros comentários e parabéns por esse e outros excelentes artigos.
R.M.C.
Excelente texto, aplicar a devida resiliência em pontos críticos é uma arte.
Obrigado pelo comentário Roberto. Eu ainda não encontrei a “Receita infalível”. O que fiz foi expor um apanhado de opções que fazem e fizeram sentido quando experimentadas por mim…
Mas a boa noticia é justamente essa: temos diariamente muitas oportunidades de colocar isso em prática. Mais até do que gostariamos…confesso. Abçs, Erdel Santos
Sábias palavras Erdel… Sempre centrado e esbanjando coaching, parabéns! Abraços
Sueli, agradeço o apreço e por seguir nossas publicações. É sempre bom quando temos algo a compartilhar e algo a acrescentar, mesmo a profissionais já com carreira solidificada e formados, como no seu caso… penso que esse é o intuito do Blog. Sucesso para voce !!