Informação sobre educação financeira é o que não falta. Há cursos on-line gratuitos na página do Banco Central (BC), Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e da Fundação Getúlio Vargas. Dicas de como lidar melhor com o dinheiro e evitar dívidas também estão disponíveis em sites especializados de gurus sobre o assunto e em livros. É possível receber ainda orientação financeira até em bancos e pontos de vendas do comércio. A grande questão é: por que mesmo com tanta informação o índice de inadimplência continua atingindo patamares inéditos em agosto, quando, de acordo com a Serasa, 57,2 milhões de consumidores têm dívidas em atraso?

Responder esta pergunta e discutir desafios foi o propósito dos participantes do painel Educação Financeira e Crédito Consciente, realizado no 11º Congresso Nacional de Crédito e Cobrança da CMS People, em São Paulo, nos dias 10 e 11 de novembro.

Victor Loyola, diretor de Business Information da Serasa Experian, salientou que a percepção do mercado é de que o consumidor não está ciente do que de fato está consumindo.

Já Fábio Moraes, diretor de Educação Financeira da Febraban, questiona o real alcance das informações produzidas sobre o tema. “A internet atinge os jovens, mas o desafio é informar públicos mais frágeis, como os idosos. Por isso, fizemos um piloto para programas de rádio e estamos testando outras mídias também”, comentou.

O diretor da Febraban ressalta ainda que a federação promoveu uma pesquisa nacional em que constatou que apenas 5% dos entrevistados disseram ter recebido algum tipo de orientação financeira de pessoas próximas. “Temos muito material, mas ainda é de difícil acesso. Então temos uma oportunidade de trabalho enorme”.                 Depois de 40 anos de atuação no mercado, Hilgo Gonçalves, especialista em varejo e clima organizacional, está aposentado. No entanto, agora atua como voluntário da causa, compartilhando boas práticas que previnam o superendividamento da população, mas garantam a sustentabilidade da indústria de crédito. “Temos informação e tecnologias disponíveis. Não precisamos inventar nada. Porém, vivemos um momento de transição. O crédito foi fomentador do crescimento no País, mas de forma artificial, porque as concessões não foram realizadas forma consciente”, explicou o especialista, que responsabiliza a própria indústria pela alta da inadimplência.

Gonçalves observa ainda que entre 2003 e 2014, a concessão de crédito cresceu 60%, especialmente para o público de baixa renda: 60% de financiamentos foram destinados a trabalhadores que recebem até três salários mínimos. Deste perfil, hoje 38% estão com metade da renda comprometida. “Nosso grande desafio é o público de baixa renda. Temos de colocar a consciência na fatura deste consumidor, questionar se ele está ciente do que está fazendo. Se cuidarmos do cliente, o cliente cuidará de nós [o mercado]”, afirmou.

Na opinião de Satoshi Fukuura, CEO da Siscom, a melhor alternativa para ajudar o consumidor a controlar o orçamento é atribuir o pagamento da dívida à manutenção dos sonhos conquistados. “Metade do nosso portfólio é de automóveis e imóveis, ainda não estão tão atrasados porque são realizações de um sonho”, defendeu.

Já a estratégia do Banco Central, que investe em educação financeira desde 2003, é criar novos produtos e estimular, a nível nacional, a implantação da educação financeira em todas as escolas públicas. “Criamos uma diretoria para falar com a população, esforço que resultou na criação de diversos produtos, como a Calculadora Cidadã e a série de vídeos Eu e o Meu Dinheiro”, conta o head do Departamento de Educação Financeira do BC, Fábio de Almeida Lopes Araújo.

Orientação

Ainda neste painel, Linda Murasawa, superintendente executiva de Sustentabilidade do Banco Santander, ressaltou os esforços da instituição em preservar a sociedade por meio do controle financeiro. “A pessoa que está endividada não dorme e começa a ter problemas seríssimos de saúde”, adverte Linda. “Por isso, quando oferecemos um produto de crédito damos a orientação financeira, para que ela não tenha um modelo compulsivo de consumo. Mostramos para ela que o relacionamento mal feito com dinheiro causa inclusive a falta de produtividade no emprego e nos estudos e ainda impacta o ambiente familiar”, apontou.

Vale ressaltar, porém, que o Santander uma das maiores taxas de juros do mercado: 469,86% ao ano no cartão de crédito rotativo e 416% ao ano no cheque especial, de acordo com as informações do Banco Central.

O mesmo acontece nos parcelamentos no carnê oferecidos pelas Casas Bahia, em que os juros chegam a dobrar o valor inicial do produto. “Estamos implementando uma nova política de parcela. O consumidor só poderá comprar aquilo que ele pode pagar. Para isso estamos treinando três mil colaboradores para conversar com cliente nos pontos de venda”, conta Sandro Almeida, diretor de Serviços Financeiros da Via Varejo, empresa responsável pela administração das Casas Bahia e Ponto Frio. “O maior desafio é manter o cliente CDC em uma condição financeira saudável. Não queremos antecipar os nossos rendimentos, mas manter as condições para que o cliente possa comprar sempre com a gente”, conclui Almeida.

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