A colunista Pilita Clark fala que é preciso buscar formas de minimizar o tempo perdido e o estresse com as mensagens eletrônicas
Sempre que checava meus e-mails, um número no canto superior direito da tela do computador costumava me encher de um desespero terrível.
Trata-se do número que mostra quantos e-mails estão na caixa de entrada. Enquanto digitava, podia ver que havia milhares deles. Outro número, no canto superior esquerdo, mostra algo que me agoniava ainda mais: os milhares de e-mails não lidos. Por algum tempo, tentei configurar filtros. Organizar o material em pastas. Reservar tempo para apagar mensagens em massa. A escala das besteiras digitais, no entanto, era esmagadora. Então, fiz algo muito mais eficiente. Eu desisti.
Nunca me arrependi da emancipadora estratégia de deixar a bagunça fluir. Foi com satisfação, portanto, que outro dia vi chegando um e-mail sobre o lançamento de “A World WithoutEmail” (um mundo sem e-mails, em inglês), do acadêmico americano Cal Newport. O livro prometia libertar os trabalhadores da tirania das caixas de correio e, de imediato, fui atrás dele.
Newport se tornou uma autoridade em discutir modos de trabalho mais racionais. Aos 38 anos, o professor de ciência da computação escreveu sete livros nos últimos 16 anos, incluindo o sucesso de 2016, “Trabalho Focado”, cujo título em inglês “DeepWork” se tornou expressão corrente quando alguém consegue ter foco no atual mundo de frenética distração.
Ele também tem um podcast, um blog, uma newsletter e três filhos com menos de nove anos. Normalmente, não trabalha depois das 17h30 em dias de semana e mantém a maioria dos fins de semana livres.
Eu diria, portanto, que ele sabe trabalhar de forma produtiva. O que mais gostei no novo livro é o fato de mostrar que o que, há dez anos, podia ser um leve inconveniente, agora se tornou em grave obstáculo à produtividade.
O trabalhador médio agora envia e recebe cerca de 126 e-mails relacionados ao trabalho por dia e muitos funcionários administrativos dedicam mais de três horas por dia para lidar com isso, relata Newport. Eles o fazem cientes de que muitas das mensagens são irrelevantes e de que poucas requerem respostas imediatas. Em parte, porque nossos cérebros hereditariamente são condicionados a preocupar-se em não negligenciar obrigações sociais. Isso fazia sentido evolutivo quando vivíamos em tribos interdependentes. Hoje, isso explica a aflição que irrompe quando se vê uma tela com e-mails não respondidos.
O problema é que, pela facilidade e baixo custo, o e-mail despertou o que Newport chama de “mente hiperativa de colmeia”, uma nova forma de trabalho de escritório que fica girando em torno a uma conversa de mensagens não programadas.
Os e-mails e seu primo mais fervoroso, o Slack, não mais apenas interrompem tarefas importantes. Eles alimentam discussões digitais infindáveis, drenadoras da atenção, sobre aqueles tipos de tarefas que hoje consideramos normais.
Em outras palavras, o flagelo dos e-mails é parte de um problema maior, sistêmico, que não pode ser solucionado com “truques” ocasionais de produtividade. O problema exige uma reformulação estrutural equivalente à forma como Henry Ford revolucionou a produção de carros com a linha de montagem.
Acredito que se trata de uma grande percepção inovadora do autor. Já quanto às ideias de Newport sobre o que pode ser feito, não estou tão convencida. As empresas são tão diferentes entre si que há poucas soluções únicas que se adequem a todas. Além disso, algumas das soluções sugeridas exigem ferramentas on-line de gerenciamento de projetos que direcionam o trabalho em tarefas específicas. Um cientista da computação, como Newport, pode ter mais familiaridade com elas.
Algumas de suas outras ideias fariam muitas empresas hesitarem. Definir horas em que o funcionário não pode ser interrompido; contratar um “ombudsman” para atender reclamações sobre estorvos à atenção dos funcionários; amplificar o apoio administrativo no local de trabalho. Essas mudanças, admite Newport, podem ser “um incômodo no curto prazo”, mas ele têm confiança de que os ganhos de produtividade de longo prazo valem a pena. Algum dia, um novo Henry Ford será recompensado por consertar o mundo imperfeito do trabalho que foi moldado a partir de inovações como o e-mail. Por enquanto, o que Newport fez foi definir a escala de um problema que poucos de nós sabíamos que existia.
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