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Passei um dia no SAC das sandálias Havaianas

por: Afonso Bazolli
em: Qualidade
fonte: Época Negócios
15 de março de 2016 - 18:20

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Como é trabalhar no call center de uma grande empresa, ouvindo queixas, problemas e elogios dos consumidores

Por: Carla Conte

Segunda-feira, 10 horas da manhã. Chego ao prédio onde está instalada a Central de Atendimento ao Consumidor Alpargatas, grupo que detém a marca Havaianas. Confesso que estou um pouco nervosa por causa do desafio que tenho pela frente: passar um dia ao lado de outras funcionárias atendendo consumidores que ligam buscando uma solução para os mais variados problemas. Talvez essa tensão inicial seja reflexo das minhas próprias experiências negativas que tive em minha vida ao ligar para call centers. Já fui mal atendida inúmeras vezes e desliguei o telefone sem ter meus problemas resolvidos outras tantas vezes. Eu sempre soube como é a experiência do lado de cá do telefone. Estar do lado de lá é algo completamente desconhecido para mim. De uma coisa eu tenho certeza: esse não deve ser o trabalho mais fácil do mundo.

Passo pela recepção e sou recebida por uma funcionária, que explica que tenho que acompanhar uma apresentação sobre empresa. Logo de cara percebo que a coisa não será mesmo fácil. Todos os atendentes devem saber de cor e salteado não só informações sobre os produtos Havaianas, mas também das demais marcas da Alpargatas. O modelo mais barato de uma sandália Havaianas custa R$ 8,90. Já o calçado mais barato da Timberland, outra marca da empresa, não sai por menos de R$ 189,90. Haja versatilidade. São produtos e clientes com perfis bem distintos e, imagino, com comportamentos e demandas bem diferentes também.

Terminada a apresentação, passo por um treinamento rápido de duas horas, bem mais compacto do que aquele que os funcionários de verdade encaram quando são contratados. Os novatos geralmente ficam duas semanas se preparando antes de ter o contato com o primeiro consumidor. Sou apresentada à ferramenta virtual que o pessoal usa para registrar as conversas. A cada ligação é preciso preencher uma planilha virtual para cadastrar todos os detalhes do diálogo com o cliente. É preciso ser muito ágil. São vários campos e um deles me gera pânico total: o modelo do calçado. A Alpargatas produz em média 750 mil pares de Havaianas por dia. Sua coleção atual tem 110 modelos e mais de 470 cores diferentes. Como alguém consegue identificar com precisão qual sandália o consumidor tem nas mãos? Ou melhor, nos pés? “Há um catálogo virtual que o profissional pode consultar durante a conversa”, afirma Monica de Oliveira, supervisora de atendimento da empresa Sercom, que presta esse serviço para a Alpargatas. Não consigo imaginar como alguém pode ouvir a reclamação do cliente, preencher aqueles inúmeros campos da planilha e ainda consultar um catálogo, tudo isso com muita agilidade, sem perder a calma e esbanjando simpatia mesmo quando o consumidor não é o que se pode chamar de bem-humorado. Sinto um frio na barriga. Começo a achar que é mais negócio ficar do outro lado da linha, como consumidor reclamão, do que ser um atendente…

Após as duas horas de treinamento, sou levada para a sala da equipe de atendimento. “A coisa vai ficar ainda mais séria”, falo para mim mesmo. O local é relativamente espaçoso com seus 92 metros quadrados, mas é propositalmente isolado do restante do andar, que tem equipes que atendem outros clientes. Ficar num local mais reservado tem uma grande vantagem: o ruído é bem menor do que nas centrais tradicionais, o que certamente garante uma conversa telefônica mais agradável e eficiente. No espaço em que estou existem 45 postos de atendimento, cada um deles com uma mesa com computador e um head set. O ambiente é agradável. Já visitei outras centrais bem mais apinhadas e barulhentas, mas aqui o pessoal é bastante animado e entrosado.

>> A reconquista do cliente

De temperamento doce e tranquilo, a atendente Camila Gomes da Silva, 23 anos, fica encarregada de ser meu anjo da guarda. Nós vamos atender juntas as ligações Havaianas que caírem no seu posto. Primeiro, fico apenas na escuta de sua conversa com os clientes. O telefone toca. É uma consumidora – bem calma – que está com dúvida sobre como enviar uma sandália para troca. No meio da conversa, tu-tu-tu-tu… “O sistema caiu”, afirma Fabio Brancaleon dos Anjos, coordenador de operação Alpargatas na Sercom. Começa aquele zum-zum-zum entre os funcionários, mas os supervisores agem rapidamente e sem provocar nenhum tipo de estresse na equipe. Acionam alguns técnicos, que logo aparecem com o diagnóstico: o problema é externo, da empresa de telefonia. Não há o que fazer, a não ser esperar. A equipe se junta em grupinhos, que começam a “tricotar” entre si. Ninguém fica irritado. Ao contrário, aquilo se tornou uma espécie de recreio de escola fora de hora. Enquanto isso, Camila e eu vamos à lanchonete tomar um suco. E ali ela me conta um pouco mais das aventuras de ser uma atendente das Havaianas, atividade que exerce há três anos.

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Depois de almoçar no restaurante por quilo da empresa, volto ao meu posto às 14 horas. O sistema já está funcionando novamente. Ouço quatro novas ligações ao lado de Camila e fico surpresa com a simpatia dos clientes. “O consumidor Havaianas é muito apaixonado pela marca, tem uma relação afetiva com o produto”, diz Ivan Felix, gerente de atendimento ao consumidor da Alpargatas. “Eles são muito gentis ao telefone na maioria das vezes”, afirma.

Do outro lado da linha, o consumidor reclama: “Olha só, tem um trenzinho frágil aqui na minha sandália. Acho que a tira está para soltar.” Ele recebe as orientações necessárias sobre a troca e como embalar e colocar o produto no correio.  “Mas é isso mesmo, não vou ter que pagar nada pelo envio das minhas Havaianas?”, pergunta ele mais de uma vez. Não, o custo é da Alpargatas. “Mas que beleza”, diz ele. O call center recebe por mês cinco mil ligações e 4.800 contatos por e-mail e mídia social referentes a Havaianas. Desse total, metade é para pedir informações gerais, como onde comprar um novo modelo ou como encontrar a loja mais próxima. A outra metade é reclamação.

>> Não basta atender bem

Respiro fundo: chegou a minha vez de atender diretamente a ligação. Camila ficará me acompanhando, na escuta. Mas combino que repassarei a ligação para ela quando achar que não tenho mais condições de continuar a conversa. Tudo acertado. Mesmo assim, fico nervosa. E se pegar um consumidor destemperado? O telefone toca. “Alpargatas, boa tarde! Meu nome é Carla, com quem falo por gentileza?” Yara Silva se identifica e, calmamente, diz que gostaria de saber como vender produtos Havaianas em larga escala, em uma loja própria que pretende abrir. Uau! Essa não era mesmo a pergunta que eu esperava ouvir para poder ajudar alguém. Não sei a resposta. Peço um momento, repasso para Camila, que informa o telefone do departamento responsável por esse assunto.

Ao final da ligação, volto a falar com Yara. Revelo minha identidade de jornalista e pergunto se ela gostaria de participar da matéria. Diz que sim, enquanto faz elogios ao atendimento. Depois dessa conversa, chegam outras ligações, a maioria com dúvidas sobre troca de sandálias com problemas na tira. Mas uma das ligações me deixa tensa: o consumidor está bastante irritado. Peço alguns dados para fazer o cadastro e ele não facilita a minha vida: “Não quero confirmar dado nenhum”. Rapidamente coloco em prática os ensinamentos que recebi no treinamento. “Senhor, eu preciso dos dados para prosseguir com o procedimento.” Ele concorda, um pouco a contragosto, e eu tento ser o mais ágil possível. O consumidor está nitidamente com pressa e quer resolver seu problema rapidamente. É mais um caso de troca de sandália. Ele recebe a informação que precisava: enviar o produto com defeito pelo correio sem custo algum para receber na sequencia uma nova sandália. Ele concordou friamente, agradeceu e desligou. Ufa! Deu tudo certo. Sinto um alívio danado por não ter tido que falar mais esse cliente. Ele realmente me deixou intimidada. “É que hoje é segunda-feira. Todo mundo fica ansioso em resolver a vida no início da semana ou fica naquele mau humor porque tem que voltar a trabalhar”, diz meu anjo da guarda. Camila explica que ter compreensão e paciência é tudo numa central de call center. “No final, dá sempre certo”, diz.

>> O consumidor é quem manda

São 16h30 e me preparo para o meu último atendimento. A jornada de um atendente não pode ultrapassar seis horas devido ao desgaste natural que esse tipo de atividade traz para a pessoa. “Alpargatas, boa tarde, meu nome é Carla…” A consumidora Vanessa de Oliveira me explica que está com problemas em duas sandálias, cujas tiras soltaram.  Na hora de identificar o modelo, me dá aquele pânico… Camila me salva mais uma vez e finaliza o caso. Antes de encerrar a ligação, volto a conversar com Vanessa e conto sobre minha reportagem. “Olha, estou acostumada a ligar para vários SACs e o da Havaianas está realmente de parabéns. É muito eficiente e rápido. Quem dera fosse sempre assim.” Vanessa não é a única satisfeita com o atendimento. Na pesquisa sobre satisfação da qual participam as pessoas que telefonam para a central, a nota média é 4,67 numa escala que varia entre 1 e 5.

Deixo a central às 17h após atender diretamente cinco consumidores e ouvir dezenas de outros. Embora me sinta exausta, reconheço que me diverti muito. O clima harmonioso entre os colegas e a atenção dos supervisores e coordenadores, sempre prontos para acudir qualquer um da turma, me chamaram muito a atenção. Isso certamente tem um impacto positivo no desempenho dos funcionários. Os treinamentos também. Os atendentes passam por reciclagem de pelo menos duas horas todos os meses, além de treinos extras quando há lançamento de coleção. Em alguns deles há sorteio de brindes, como toalhas, chaveiros e sandálias, o que motiva bastante o pessoal. “Quem não gosta de ganhar uma Havaianas?” diz uma funcionária apaixonada. Não tem quem não tenha um par em casa. Mas aumentar a coleção é bom demais.”

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Comentários (3)
  1. apesar de difícil atender o consumidor, este é realmente um trabalho apaixonante. Sempre goste, fiz carreira e se pagasse melhor, estaria lá até hoje,. Parabéns pela coragem da jornalista. Lembro porém que o produto é um produto agradável de se trabalhar. Muito difícil são aqueles que envolvem prestação de serviço, como seguros por exemplo. Gostei muito da matéria.

    mercedes em 18 de março de 2016 - 10:53
  2. Bela matéria….Sercom cresceu demais nos últimos anos e as Alpargatas nem se fale…um belo casamento entre as empresas.

    raphaelveiga em 16 de março de 2016 - 14:21
  3. Muito legal a matéria da jornalista no Call Center da Havaianas. Parabéns!!

    JOSE CARLOS PESSOAS em 16 de março de 2016 - 10:22

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