Por: Fernando Torres
Há uma pedra no meio do caminho do plano do Banco Central para tentar reduzir os elevados spreads cobrados nos empréstimos a pessoas e pequenas e médias empresas: o reduzido número de bancos que atua no varejo.
Não é a primeira vez que o regulador tenta tratar do assunto, e quem acompanha o tema sabe que se trata um problema que, se é que pode ser solucionado, exige que se ataque em várias frentes simultaneamente.
Uma delas é o estímulo à concorrência, tarefa que se torna cada vez mais difícil na medida que a concentração bancária aumenta de forma significativa ano após ano.
Quando se fala no tema no Brasil, a medida que mais comumente se usa é dizer que os cinco maiores bancos do país – Banco do Brasil, Itaú, Bradesco, Caixa Econômica Federal e Santander – concentram hoje 70% do total de ativos do sistema, ante uma fatia de 51% no fim de 2006.
Mas do ponto de vista de pessoas físicas e pequenas e médias empresas, o que espelha mais esse movimento é a concentração do número de agências. Afinal, é por meio delas que os clientes normalmente são atendidos, seja presencialmente ou por meio de um gerente de relacionamento.
Após a saída do HSBC e do Citi do segmento de varejo, que tiveram as operações compradas por Bradesco e Itaú, respectivamente, esses mesmos cinco grandes bancos possuem hoje 90% dos pontos de atendimento bancário do país, em comparação com uma participação de 70% há dez anos.
Para quem acha esse dado preocupante, a má notícia é que não existe nenhum sinal de que o quadro vai mudar.
Com as exceções que confirmam a regra, os bancos pequenos e médios vêm quebrando, sendo engolidos pelos grandes ou tirados de seus antigos nichos do mercado, como ocorreu mais recentemente com o crédito consignado. Alguns ainda resistem, especialmente atendendo a necessidade de capital de giro de empresas de médio porte que não possuem limite suficiente nos “bancões”. Mas para por aí.
Paralelamente a um movimento natural de busca por escala dos próprios agentes de mercado, o aumento da exigência mínima de capital determinada pelo comitê de Basileia e seguida pelo Banco Central no Brasil tem demonstrado um efeito claro, ainda que aparentemente contraditório, de favorecer grandes instituições – tanto aqui no país como mundo afora.
Seja porque esses conglomerados têm mais poder para levantar capital no mercado, seja porque, logo após reforçarem o patrimônio, eles se tornam ainda mais seguros que os outros na percepção dos depositantes.
O fato é que os bancos que já eram grandes demais para quebrar estão cada dia maiores (em que pese a obrigação de que criarem um plano de dissolução em caso de crise).
Há que se reconhecer que, tirando o fato de não ter barrado nenhum ato de concentração do mercado nos últimos anos, o Banco Central tem agido para ao menos tentar estimular a concorrência, seja na área do crédito ou na prestação de serviços.
Mas dá para fazer mais.
Ao dar transparência para as taxas de juros praticadas pelos bancos em diferentes linhas de crédito, por exemplo, o BC tenta estimular a concorrência. Mas é possível aperfeiçoar o sistema. Grandes conglomerados financeiros privados concedem empréstimos com diferentes CNPJs e não é possível saber, de fora, qual é a taxa média realmente praticada pela instituição como um todo.
Além disso, o sistema em que o BC divulga essas taxas não permite que se construa séries históricas de forma automática. Existem apenas retratos de intervalos de cinco dias.
Fazendo acompanhamento sistemático desses dados desde 2012, aliás, é possível notar que nas linhas de consignado (seja de INSS ou do setor público) e também de financiamento de veículos parece haver uma concorrência maior por “preço”, o que provavelmente contribui para a queda dos spreads.
E o que essas linhas têm em comum, além da garantia maior, é que são ofertadas normalmente fora das agências, pelos pastinhas ou nas concessionárias de veículos.
Tentar promover a oferta de produtos e serviços bancários em ambientes em que os concorrentes precisem se enfrentar diretamente – não entrincheirados nas agências, mas em plataformas eletrônicas, por exemplo -, talvez estimule a queda dos spreads nos empréstimos e também nas tarifas cobradas por serviços (e quem sabe até dê capilaridade aos menores para captar mais depósitos).
No que se refere às tarifas, o BC também criou os pacotes de serviços padronizados – mais baratos e que facilitam a comparação entre os concorrentes – e a conta eletrônica, que não tem custo nenhum de manutenção (só se paga por serviços avulsos).
É uma maravilha, não fossem as barreiras colocadas pelos bancos para que o cliente consiga trocar um pacote mais caro por essas opções.
Os sites das instituições escondem dos clientes que essas alternativas. E se alguém insistir muito será obrigado a ir fisicamente à agência para contratá-las – ao passo que para ser “migrado” para um pacote mais caro o cliente não precisa sequer consentir, já que muitas vezes a troca é feita à revelia.
Também nessa seara o Banco Central tem agido. Ao divulgar regularmente o ranking das instituições com mais reclamações, o regulador pretende expor quais são aquelas que erram mais ou cometem mais irregularidades.
Isso tem o intuito não apenas de potencialmente influenciar os cidadãos na escolha das instituições com as quais quer ter relacionamento bancário, como também o de incentivar o bom comportamento dos bancos que restaram.
Mas, de novo, sempre é possível aperfeiçoar o mecanismo. Uma das maneiras seria unificar algumas tipos de reclamações em grandes categorias. “Débito em conta não autorizado pelo cliente”, “cobrança irregular de tarifa” e “cobrança irregular de tarifa em cartão de crédito” são problemas da mesma natureza. E têm como característica comum o fato de o banco tomar empréstimo sem juros do cliente, para dizer o mínimo (já que a pena máxima é a devolução do dinheiro sem nenhuma correção ou pena).
Outra ação possível ligada a atendimento seria o Banco Central investigar mais a fundo essas reclamações no nível do SAC e da ouvidoria dos bancos. Quando 50 ou 200 casos de um mesmo banco chegam ao BC, quantas cobranças irregulares foram feitas de verdade? Como separar um erro de uma prática deliberada (ou desesperada) para atingir metas agressivas?
Dizer que os cinco grandes bancos não competem seria uma grande besteira. Mas o nível de concorrência varia bastante a depender do tipo de serviço prestado e do cliente atendido. É aí que o regulador pode agir.
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