Por: Ezequiel Frandoloso
A Medida Provisória nº 656, de outubro de 2014, trata das aquisições imobiliárias. Com relação ao crédito consignado, a intenção da MP foi deixar as responsabilidades de cada parte integrante do negócio jurídico mais detalhadas. E mais, adaptar a Lei nº 10.820, de 2003 às inovações ocorridas após sua edição. Também permitiu expressamente que empresários individuais tenham responsabilidade no desconto de parcelas de empréstimos feitos por seus empregados.
Já a Letra Imobiliária Garantida (LIG) – que é uma promessa de pagamento em dinheiro emitida sob a forma escritural -, fica separada dos ativos e a instituição financeira continua responsável pelo papel escritural. A expectativa é que a LIG traga maior segurança jurídica aos financiamentos de longo prazo, reduza os custos na aquisição de imóveis e atraia investidores estrangeiros. Isso porque a LIG possui padrão internacional e a poupança estrangeira poderá ser usada para aquisição do novo papel a ser regularizado pelo Banco Central, criando um recurso adicional para o mercado de crédito imobiliário com a vantagem de isenção de Imposto de Renda para pessoa física residente no país e para residente ou domiciliado no exterior, exceto em país com tributação favorecida a conforme o artigo 24 da Lei nº 9.430, de 1996.
O objetivo da MP é alavancar o financiamento imobiliário e também fomentar o crédito no mercado financeiro. Porém, o que mais chamou a atenção foi a implantação de um sistema único de informações contidas nos registros imobiliários, a chamada concentração dos atos registrais na matrícula imobiliária ou também Renavam dos Imóveis.
O prazo de vigência da norma é de 60 dias, prorrogáveis por mais 60. Se não for convertida em lei, perderá eficácia
Atualmente, a varredura de processos judiciais em trâmite contra o devedor indica se existem ações judiciais contra o proprietário do imóvel. Caso existam registros negativos e se o resultado final de um processo judicial for desfavorável ao proprietário/vendedor, o imóvel, em algumas situações, pode ser atingido, mesmo que o bem já tenha sido transferido ao comprador. A ideia da MP é imprimir maior segurança e confiabilidade aos negócios imobiliários no país. O comprador deve ter a certeza da existência de ações judiciais capazes de atingir o imóvel.
A expectativa é que a MP diminua o tempo e o custo para obtenção de documentação, facilite a concessão de crédito, com a redução de custos e celeridade. Isso porque, com a matrícula, o interessado terá acesso a todas as informações que possam atingir o imóvel. Atualmente, quando alguém busca segurança na aquisição de um imóvel, dentre outras medidas, deve obter diversas certidões de distribuição de processos ajuizados em nome do vendedor em todo o território nacional, exigência que também é feita pelos bancos.
A MP afasta eventual alegação de evicção disposta no artigo 447 do Código Civil, ou seja, não poderá um credor opor qualquer situação jurídica não constante da matrícula do imóvel contra o adquirente de boa-fé que adquirir ou receber o imóvel. Porém, a assertiva é relativa.
Existe a possibilidade de um credor do proprietário/vendedor ficar privado da penhora sobre o imóvel que foi alienado no curso de uma ação judicial, ou seja, nos casos em que o proprietário, sabendo que não obterá êxito na ação, acelera a venda do bem para livrá-lo de constrição, frustrando o efeito prático da condenação e a fraude. Nesse caso, poderá ser reconhecida a má-fé do terceiro adquirente mesmo que não haja registro na matrícula, nos termos da Súmula nº 375 do Superior Tribunal de Justiça.
Portanto, a MP não confere garantia absoluta de ausência de evicção, embora traga em seu bojo que ninguém poderá opor situação jurídica inexistente na matrícula concentrada, até porque, como dito, o Judiciário tem reconhecido a existência de fraude à execução em hipóteses de comprovação judicial da má-fé do terceiro adquirente.
O Renavam dos imóveis, como é chamada a MP, deve ser implementado dentro de dois anos, nos termos do artigo 17. Durante esse período, os credores podem atualizar matrículas com débitos anteriores à entrada em vigor da norma. Obviamente que, até 7 de novembro de 2016, o comprador deverá ter cautela e continuar a obter certidões negativas sobre o imóvel e também do proprietário vendedor. Para garantir que o bem esteja livre de restrições, não basta obter certidões dos distribuidores do local do imóvel.
O credor judicial deverá ser diligente ao providenciar o registro da citação ou a averbação da existência da ação na matrícula do imóvel, inclusive aqui seria interessante estipular um prazo não superior a cinco dias para que o cartório de Imóveis faça a averbação para todas as situações descritas na MP, e não apenas para os casos com determinação judicial, a fim de evitar surpresas e prejuízos tanto aos credores que pretendem fazer a anotação no referido cartório quanto para o adquirente do imóvel. Vale esclarecer que a MP ainda não foi convertida em lei. O prazo de vigência da norma é de 60 dias, prorrogáveis por mais 60. Se não for convertida em lei dentro do referido período, perderá sua eficácia.
Ezequiel Frandoloso é advogado especializado em direito civil e constitucional de Trigueiro Fontes Advogados, em São Paulo
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