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26 de agosto de 2014 - 18:00

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Antes de investir em projetos inovadores de gestão de pessoas, é preciso saber se sua empresa está preparada para recebê-los

Por: Fernanda Bottoni

Quando chegou para assumir a área de recursos humanos do MercadoLivre, há sete anos, Helen Menezes tinha o desafio de estruturar todo o departamento. Na época, a empresa tinha apenas 70 funcionários — hoje são 600 — e os processos de pessoas eram todos terceirizados.

“Não tínhamos benefícios, não fazíamos atendimento e os funcionários estavam muito insatisfeitos”, diz ela. Aos poucos, Helen foi introduzindo uma série de mudanças e projetos. Entre eles, programas de recrutamento e seleção, pesquisa de clima e, claro, um pacote de benefícios.

Na hora de aplicar a avaliação 360 graus, porém, percebeu que tinha avançado demais. “Quando vi o resultado, percebi que ainda não tínhamos maturidade para isso”, revela. “Simplesmente jogamos a ferramenta sem considerar se as pessoas estariam preparadas para usar.”

O que aconteceu com Helen em meados de 2007 acontece o tempo todo com vários profissionais de recursos humanos que, deslumbrados com práticas adotadas por companhias consideradas bench­mark em gestão de pessoas, buscam apressadamente transportar para sua empresa as mesmas ferramentas sem levar em conta o grau de maturidade corporativa que elas têm.

Muitas acabam percebendo — como Helen — que deram um passo maior que a perna e precisam recomeçar do zero. “Não adianta implementar uma avaliação 360 graus em uma empresa que não tem cultura de avaliação”, diz Djair Picchiai, consultor e professor da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV-Eaesp). “Tem de começar aos poucos, respeitando o tempo, indo do mais simples ao mais sofisticado ou não vai funcionar.”

Identificar o grau de maturidade corporativa de sua empresa permite que o RH defina até que ponto avançar nas suas práticas e transformar boas intenções em projetos eficientes.

Segundo Henri Vadat, sócio-líder da área de capital humano da Deloitte, o reconhecimento do estágio de maturidade da empresa ajuda a área de recursos humanos a visualizar quais projetos fazem mais sentido no momento vivido pela organização, para promover seu crescimento sustentável.

“O RH precisa estar alinhado e em sintonia com a cultura da empresa para dar respostas efetivas a necessidades reais de negócio”, afirma. Do contrário, vai desperdiçar tempo, energia e dinheiro.

No caso do MercadoLivre, o principal gargalo encontrado nos resultados das avaliações de desempenho foi na análise feita por pares e subordinados, que não estavam acostumados a avaliar ninguém. “A metodologia era muito boa, mas não deu nada certo porque ficou muito na percepção do eu gosto ou não gosto de você”, diz Helen.

Um passo atrás

Para resolver o impasse, Helen precisou parar a avaliação e desenvolver um treinamento interno. “Dividimos as pessoas em grupo, mostramos o que era uma avaliação 360 graus e por que ela estava sendo aplicada, treinamos todos com a ferramenta e explicamos o que significava cada pergunta”, diz ela.

O processo durou uma semana, mas o aprendizado ela levou por todos os anos seguintes. “Repetimos as apresentações anualmente antes de aplicar a avaliação. Dessa forma, os novatos aprendem e os veteranos reciclam o aprendizado”, diz. “Essa estratégia não reduz o risco a zero, mas diminui as chances de dar errado.”

A fabricante mundial de laminados de alumínio Novelis também precisou dar um passo atrás depois de avançar o sinal da gestão de pessoas. Em março do ano passado, Cláudia Queiroz, gerente de recursos humanos, colocou em ação um programa aparentemente muito simples de recrutamento interno.

Para sua surpresa, no entanto, o projeto não teve aderência imediata dos funcionários e o número de inscritos no processo ficava sempre aquém da expectativa. O motivo? “Muitos tinham receio de se inscrever simplesmente porque não conheciam as outras áreas da empresa”, explica Cláudia. “Ouvi muitas pessoas dizendo que tinham ficado interessadas, mas que estavam inseguras para se inscrever porque não sabiam o que fariam.”

A falta de conexão entre os departamentos foi reforçada pela pesquisa de clima, que deixou ainda mais claro que as pessoas queriam entender como funcionavam as outras áreas. Antes de buscar melhoras nos índices de recrutamento interno, portanto, a área de RH criou outro programa, o Conexões, inaugurado oficialmente em março deste ano.

O projeto promove fóruns virtuais e presenciais nos quais as áreas explicam seus papéis e responsabilidades. As duas primeiras voluntárias foram a jurídica e a de atendimento ao cliente. “Nossa ideia é fazer um giro por todas as áreas durante o ano e recomeçar tudo no ano seguinte num processo contínuo”, diz Cláudia.

O movimento já começou a trazer resultados. O programa de recrutamento interno, iniciativa da equipe de Claudia para a América do Sul, foi adotado globalmente pela empresa em julho deste ano. Além disso, embora ainda não haja números, a percepção de Cláudia é que o receio dos funcionários de mudar de área já tenha diminuído.

“É importante avaliar o momento da empresa para oferecer soluções adequadas a seus objetivos”, diz ela. “Quando o RH insiste em implementar uma ferramenta só porque está na moda não consegue trazer resultado algum.”

Preparando a casa

Identificar se sua empresa está madura o suficiente para adotar uma nova prática não é uma tarefa simples. Para Lygia Villar, diretora de RH da Brookfield Incorporações, essa identificação, por si só, não é suficiente. “Não dá simplesmente para diagnosticar se a organização está ou não madura para uma implementação e ir em frente ou descartar a ideia”, explica. “É preciso trabalhar para que ela amadureça, construindo junto, fazendo a lição de casa antes de investir em um grande projeto.”

Em 2011, a Brookfield Incorporações criou seu Comitê de Carreira e Desenvolvimento, espécie de debate em que os gestores, em grupo, analisam seus subordinados e podem, assim, definir as movimentações de carreira de cada um.

Para que a companhia inaugurasse esse projeto, porém, foram necessárias várias etapas anteriores. “Eu não cheguei e implantei o comitê”, explica Lygia. “Tive de construir algumas coisas antes para preparar os gestores e depois implementar o projeto.”

Primeiramente, nasceu a ideia da universidade corporativa, em 2009. Depois, surgiu o programa de gestão por competências. “Para que desse certo, também precisamos dar uns passos para trás, explicando o conceito de competências, avaliando os gestores, trabalhando a avaliação de desempenho para cada posição e criando as trilhas de carreira”, diz Lygia, que credita a eficiência do Comitê a esses dois anos de maturação.

“Se todos esses passos não tivessem sido trabalhados, possivelmente chegaríamos à reunião com critérios totalmente pessoais de avaliação”, afirma. “Teríamos uma prática fashion, mas sem efetividade.”

Maturidade não é tamanho

Ter cuidado e paciência antes de implementar práticas de gestão não é responsabilidade apenas de empresas menos estruturadas ou pequenas. Afinal, maturidade corporativa não tem a ver com o tamanho da companhia nem com o tamanho da área de recursos humanos.

Para Henri Vadat, da Deloitte, empresas maduras são aquelas que compreendem que, por trás dos resultados financeiros, que são apenas indicadores de chegada, há uma série de outros investimentos, como o relacionamento com clientes, a ampliação da capacidade de inovação, a melhoria de políticas e processos internos e o crescimento e o desenvolvimento da organização. “Nessas empresas, o capital humano é percebido como o principal fator para geração de valor presente e futuro”, diz ele.

Veterana no Guia VOCÊ S/A — As Melhores Empresas para Você Trabalhar — e referência para muitas companhias em práticas inovadoras de gestão de pessoas, a americana Whirlpool é um ótimo exemplo. Apesar de já contar com muitas ferramentas sofisticadas em seu portfólio de RH, a fabricante de eletrodomésticos não se precipita na introdução de novos projetos e programas.

As primeiras sementes do que seria sua Universidade Corporativa, inaugurada neste ano, foram lançadas em 2005. “Fomos acompanhando feedbacks e pesquisas internas para saber como poderíamos preparar as pessoas para o primeiro cargo de gestão”, diz Fernanda Leal, gerente de desenvolvimento organizacional.

Entre 2009 e 2010, a companhia criou a Escola de Líderes, com foco no desenvolvimento de gestores. “Na época, o RH até cogitou criar uma universidade corporativa, mas avaliou que ainda não tinha o grau de maturidade adequado.”

Há um ano e meio a ideia começou a tomar forma, quando a empresa alocou um trainee para cuidar de todo o projeto. “Como RH, nós nos cercamos de diversas ferramentas para ouvir a opinião dos colaboradores sobre o que fazemos”, explica Fernanda. “Por meio de diversas fontes e coletas de dados percebemos que o assunto tinha credibilidade aqui dentro e que, naquele momento, estávamos num patamar maduro para dar andamento ao projeto.”

Foi assim, quase dez anos após os primeiros rabiscos, que nasceu a Universidade Whirlpool. Uma forma de garantir que o investimento aplicado no projeto será revertido para o negócio — e não mais uma ideia do RH que vai morrer na gaveta.

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