Por Lucy Kellaway
O chefe mais difícil que já tive foi um homem inspirador e honrado. Eu o respeitava e aprendi muito com ele. O problema é que eu nunca conseguia prever como ele iria responder a alguma coisa.
Às vezes ele passava do meu lado e dizia alguma coisa sarcástica sobre um artigo que eu havia escrito. Outras vezes, ele me enchia de elogios. Ocasionalmente ele se empoleirava na beirada de minha mesa e falava como se desse importância às minhas opiniões. No dia seguinte, ele aparecia carrancudo e me ignorava completamente.
A simples visão dele avançando pelo corredor era suficiente para me deixar ansiosa. Quando ele era gentil, seu rosto tinha a mesma expressão de quando ele era terrível, e assim comecei a pensar que seus elogios eram ironias. Era uma coisa muito desconcertante.
Outro dia lembrei-me dele ao ler uma pesquisa da Universidade de Michigan sugerindo que preferimos muito mais ter um chefe que é terrível o tempo todo do que um que é terrível apenas parte do tempo. No que diz respeito aos nossos chefes, parece que podemos lidar com praticamente tudo, menos com a imprevisibilidade.
Os pesquisadores realizaram uma série de experiências em que dividiram estudantes em três grupos e os encarregaram de uma tarefa. O primeiro grupo foi submetido a elogios constantes, o segundo a abusos constantes e o terceiro a uma mistura dos dois. O primeiro grupo não ficou nem um pouco estressado. O segundo, ficou um pouco, enquanto que o terceiro – o grupo que não sabia se iria ser elogiado ou criticado -, mostrou-se de longe ser o mais estressado e o menos feliz.
Essa experiência, descrita minuciosamente na “American Academyof Management”, me lembra de um estudo anterior em que ratos receberam choques elétricos. Um grupo ouvia uma campainha anunciando cada choque; um segundo grupo recebia choques sem aviso. O primeiro grupo de ratos saiu-se mais ou menos bem. O segundo grupo, que não conseguia prever o momento dos choques, desenvolveu úlceras no estômago. Trabalhadores e ratos têm muita coisa em comum. Mesmo assim, a ideia de que a consistência é importante não aparece em lugar nenhum da literatura sobre liderança. A previsibilidade é considerada uma coisa chata e nada fascinante em um mundo que reverencia a criatividade e a ruptura.
Recentemente, a “Harvard Business Review” publicou um texto sobre as características mais importantes dos líderes, conforme relatado por 195 líderes globais. Ele acabou parecendo uma lista mais ou menos piegas sobre as “competências”, que incluem “solidez ética”, “estímulo ao crescimento”, “tem a flexibilidade para mudar de opinião” e “é comprometido com a formação contínua”, e assim por diante. A previsibilidade não aparece na lista.
A única companhia em que vejo esses valores explicitamente é o Google. Como ele se delicia recolhendo dados e avaliando constantemente todos os líderes, constatou que a consistência é uma das qualidades mais importantes que existem. Quando o chefe não é consistente, as pessoas não podem dar o seu melhor.
A previsibilidade é importante no trabalho não só em relação ao seu chefe, mas em relação a quase tudo. As pessoas afirmam que adoram empregos em que um dia é diferente do outro, mas há poucas evidências que apoiem isso. Em vez disso, estudos feitos nos Estados Unidos têm mostrado que os trabalhadores que lidam com mais imprevisibilidades são mais estressados e menos felizes do que aqueles que mantêm uma agenda de trabalho regular.
Se eu pensar em meus colegas, provavelmente vou dizer a você que adoro trabalhar com pessoas que me surpreendem. Mas isso não é verdade. Gosto de trabalhar com pessoas que me interessam, mas que nunca me surpreendem. Um colega próximo sempre chega atrasado ao trabalho. Embora eu seja obsessivamente pontual, acabei me acostumando tanto aos seus atrasos que quando ele chegou mais cedo, na semana passada, não fiquei feliz, e sim um pouco incomodada.
Não que a consistência seja uma coisa fácil. Na verdade, ser consistente é bem difícil. Sei disso por já ter passado um quarto de século sendo mãe. Na criação de meus filhos tentei me ater a alguns princípios bem básicos que considero importantes. Por exemplo, que todos os membros de minha família precisam se sentar em torno de uma mesa pelo menos uma vez por dia, sem nenhuma tela de computador na frente, comendo a mesma coisa ao mesmo tempo. Certas noites sou inflexível quanto a esse princípio.
Mesmo assim, lá estava eu esparramada no sofá na semana passada, com meu filho, que comia uma pizza de supermercado e se entretinha com algo inconveniente em seu iPad, enquanto eu comia e assistia a outra coisa na TV. A previsibilidade é coisa das classes mais avançadas: a imprevisibilidade parece ser o padrão da condição humana.
Acabo de ler um artigo na “PsycologyToday” afirmando que ficamos assim porque isso criou dificuldades para outros caçadores se aproveitarem de nós na selva. Eu suspeito que sejamos imprevisíveis no trabalho porque gerenciar não é uma coisa natural e somos fracos e volúveis. O autocontrole não só é difícil de praticar, como infelizmente está fora de moda.
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