Por: Letícia Arcoverde
Durante um mês, em julho do ano passado, o estudante de engenharia de produção Flávio Toni, de 23 anos, acompanhou de perto o trabalho do presidente da consultoria em recursos humanos Adecco no Brasil, Sean Hutchinson, 49. De conversas com clientes a uma reunião estratégica com o executivo-chefe regional, o estudante passou, na estimativa de Hutchinson, quase 80% do tempo do comandante da empresa na sua “cola”.
Toni foi selecionado pela Adecco no concurso “CEO por um mês”, um programa global no qual estudantes e recém-formados se candidatam para ganhar a oportunidade de participar de um estágio remunerado de um mês na companhia do principal executivo da empresa em seu país. Se forem selecionados posteriormente, também passam um período trabalhando com o CEO global, em Zurique. O processo seletivo que escolheu Toni entre quase 500 inscritos brasileiros envolveu testes on-line, dinâmicas de grupo e uma entrevista final com o próprio CEO.
Competições como a da Adecco, voltadas para estudantes ou jovens profissionais, são cada vez mais adotadas como estratégia para atrair talentos em grandes empresas. Assim como programas de trainee, elas buscam apresentar a marca da companhia para universitários – Toni conta que nunca havia considerado trabalhar em uma consultoria de RH até receber o anúncio do concurso por e-mail – e atrair talentos jovens que apresentem algumas das características mais desejadas por recrutadores, como pró-atividade, motivação e a disposição para fazer mais do que o esperado. Para os estudantes, além dos prêmios oferecidos pelos concursos, o esforço pode levar a ofertas de emprego ou, ao menos, um diferencial no currículo. Mas é importante estar atento aos regulamentos para entender as exigências das empresas.
No caso de Toni, que ainda vai se formar no seu curso do Centro Universitário FEI no fim do ano que vem, a experiência levou a um emprego na Adecco, em uma vaga da área de inteligência de mercado na qual ele se reporta diretamente ao CEO brasileiro. Além do trabalho direto com Hutchinson durante o mês de programa, contou a favor do futuro engenheiro um projeto de otimização de processos desenvolvido em paralelo durante o período. “O programa deu uma visibilidade grande de toda a operação no Brasil, porque eu ia junto a reuniões em filiais, clientes e até na reunião de ‘operation review’ com o CEO da América Latina. E participei não só como ouvinte, mas a todo momento me perguntavam o que eu achava”, diz Toni.
Para Hutchinson, a formação do estudante ajudou nesse processo, por trazer para à consultoria de RH um background de engenharia e de vendas técnicas, adquirido em seu emprego anterior. Assim, o executivo-chefe diz que não foi só o jovem profissional que aprendeu com a experiência. “CEOs não têm a resposta para tudo, e foi bom ter outra pessoa para trocar ideia, principalmente alguém jovem, que pode ver as coisas por outro ângulo”, diz.
Globalmente, a competição está na quarta edição. No Brasil, ela acontece pela segunda vez este ano. A seleção já está sendo realizada para escolher uma nova “sombra” para Hutchinson. O CEO diz que a possibilidade de o estudante ser efetivado após o estágio será estudada durante o programa.
Sofia Esteves, presidente do grupo DMRH, que inclui a Cia de Talentos, de recrutamento de jovens, considera a participação neste tipo de programa um diferencial no currículo, uma vez que as empresas cada vez mais observam a “história de vida” dos profissionais. “Ajuda a mostrar pró-atividade e iniciativa, além de dar todo um repertório que pode ser contado em um processo seletivo”, diz. O fato de muitas dessas competições envolverem o contato com altos executivos dá a oportunidade de “deixar uma boa marca” e ser considerado para vagas, mas também pode ajudar o jovem a ter mais desenvoltura em futuras entrevistas de emprego.
Ela percebe mais empresas apostando em desafios tanto como forma de gerar um relacionamento com jovens quanto para buscar visões de fora da empresa – muitos são voltados para inovação e desenvolvimento de produtos, que podem ser aproveitados pelas companhias. Há o já conhecido “Brandstorm”, da empresa de cosméticos L’Oréal, que neste ano ampliou o escopo para incluir projetos de profissionais da área de tecnologia, e que dá prêmios em dinheiro para as equipes vencedoras da etapa global. Voltado para estudantes de engenharia, o concurso global “Go Green in the City”, da Schneider Electric, seleciona ideias para gerenciamento de energia e premia a equipe vencedora com uma oferta de emprego.
Concursos que julgam ideias de produtos, no entanto, muitas vezes exigem que os participantes abram mão da propriedade intelectual do projeto apresentado não só em caso de vitória, mas em qualquer etapa da competição. A professora da pós-graduação da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo Maria Cristina Barboza explica que essas exigências podem impedir que a obra seja usada pelo aluno no futuro. “O participante deve observar com atenção o edital ou regulamento, verificar se o mesmo atende os requisitos legais e, principalmente, atentar-se às condições de participação, que podem incluir a cessão de vários direitos como os autorais e de imagem”, diz.
A 3M organiza um desafio de inovação há quatro anos globalmente e três no Brasil, país que recebeu o recorde de inscrições no ano passado, com mais de 700 interessados. Ao invés de julgar ideias dos participantes, o “Invent a New Future Challenge” seleciona 15 estudantes para passar um dia na operação da 3M no Brasil e resolver um “business case” da própria empresa, terminando por apresentá-lo para a diretoria. Cada país seleciona um vencedor, que participa de um processo similar na matriz, nos EUA. A equipe ganhadora do desafio global recebe um programa de mentoring de seis meses com um alto executivo da companhia no seu país.
Segundo o diretor de RH da 3M no Brasil, Fernando do Valle, o objetivo é conhecer mais os jovens profissionais e fazer com que eles conheçam a empresa em mais profundidade. Os 15 finalistas também ganham a possibilidade de pular a primeira etapa da seleção para o programa de trainee da 3M. Do grupo que participou no ano passado, quatro se tornaram trainees. Outros dois profissionais, de anos anteriores, hoje trabalham na companhia. “É uma forma muito legal de aproximação e de a empresa mostrar a marca e, assim, criar atratividade”, diz.
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