Por: Karin Parodi
Trabalho em uma empresa de médio porte, gosto do que faço, mas não vejo mais grandes perspectivas de crescer internamente. Além disso, a companhia fez alguns cortes em razão da crise e a chefia nem ao menos reconhece a dedicação e o esforço que tenho feito para dar conta do trabalho extra. Recentemente, recebi uma proposta de emprego para atuar em uma função que normalmente nem me interessaria. Nesse atual contexto, porém, pensei que poderia ser uma oportunidade de “mudar de ares” e melhorar meu salário. Também considero levar essa oferta aos meus atuais empregadores para ver se consigo uma promoção ou aumento. O que devo fazer?
Gerente, 28 anos Resposta:
“Conhece-te a ti mesmo e conhecerás o universo e os deuses”, Sócrates (469 a.C. 399 a.C.). “Conhece-te a ti mesmo” tornou-se um slogan de autoajuda. Segundo o filósofo grego, porém, conhecer-se é o ponto de partida para uma vida mais equilibrada, autêntica, feliz, e também para uma maior capacidade de entender outras vidas e contribuir positivamente para elas. O autoconhecimento é a ponte para o conhecimento do mundo inteiro, e também para o conhecimento da verdade.
Sendo algo tão abrangente e profundo ao mesmo tempo, compreende-se que conhecer-se é um processo. Ele não tem fim a cada dia podemos aprender mais e provoca mudanças o tempo todo, seja na forma como interagimos com o mundo e com as outras pessoas, ou na maneira de aprendermos novas coisas.
Após esta reflexão, a solução para o seu caso parece ser saber quem você é. Esse é o passo fundamental para entender o que você quer ser, aonde deseja ir e como vai chegar lá. Só com autoconhecimento conseguimos escolher com eficácia entre um caminho e outro, porque uma escolha mais alinhada com nossos valores e crenças tem as probabilidades de êxito ampliadas.
Agora, vamos ao lado prático da vida. Comece por esboçar o que você quer para a sua carreira e para sua vida em geral nos próximos cinco anos. Pelo que percebo, você não tem muita clareza sobre isso, uma vez que cogita ir fazer algo que não o interessa em outra empresa. Esse é seu calcanhar-de-aquiles, para continuar nas referências à Grécia Antiga.
Você cita poucas perspectivas de crescer internamente e a falta de reconhecimento, mas, ao mesmo tempo, quer fazer o que chamamos de “leilão” com seu empregador. Parece-me muito confuso esse movimento. Em sua opinião, o salário seria motivo suficiente para alguém mudar o rumo da carreira? Eu, particularmente, acho que não. Trata-se de um motivo muito fraco para uma escolha importante como essa.
Você já pensou em qual é o desdobramento estratégico dessa escolha no longo prazo?
O fato de você não se sentir reconhecido poderia ser um gatilho para outras coisas, como uma conversa de feedback com seu gestor que lhe permitisse entender como ele e a empresa avaliam seu trabalho atual e seu potencial. Por que não aproveita a oportunidade? Juntando o que ele lhe disser com seu próprio esforço socrático de autoconhecimento, você poderá saber se essa empresa vale a pena ou não. Então, e só então, poderá pensar em reivindicar algo.
Suponhamos que você decida ficar onde está, mas reivindicando melhorias, como um aumento salarial ou uma promoção. No cenário econômico atual, prepare-se com fatos e dados que o justifiquem consistentemente, desde projetos implementados até resultados obtidos. Se a empresa fez demissões, ela deve estar passando por dificuldades, o que tende a reduzir as chances de você e qualquer colega conseguir aumento.
Nesse caso, eu não utilizaria a tática do leilão, levando a oferta de outra empresa para que o atual empregador a cubra. Isso tende a ser um caminho sem volta. Há um risco altíssimo de a empresa não ver espaço para mudança e lhe desejar boa sorte no novo desafio e, pior, de se sentir ofendida por você tentar fazer “leilão”. Perdi a conta dos executivos leiloeiros que conheci com resultados desastrosos.
Meu diagnóstico, baseado em sua mensagem, é de que você não está preparado o suficiente para fazer escolhas conscientes e alinhadas com seus verdadeiros valores e desejos mais profundos. Uma escolha que contemple a busca de um trabalho e uma vida com mais propósito se opõe a uma escolha de ocasião, com validade de curtíssimo prazo.
Por isso comecei com Sócrates e com ele termino: conhece-te a ti mesmo. (E só te movimentes depois).
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