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20 de agosto de 2018 - 18:00

Depois-da-tempestade-como-resgatar-energia-e-motivacao-time-televendas-cobranca

Por: Daniel Castello

Pouco a pouco o cenário vai clareando. Não estou dizendo que será um grande ano para a economia como um todo, mas será muito melhor que os dois anos passados.

Por incrível que pareça, passou o pior a tempestade. O mar ainda está agitado, ainda pode ser que chova um pouco, o perigo não passou por completo, mas o cenário está estável e, se chegamos até aqui, não tem nenhum motivo para não avançarmos com mais força a partir deste momento.

E agora?

Durante a tempestade, por incrível que pareça, gerir é simples (simples, não fácil!). Ninguém quer perder seu emprego, logo as demandas por aumentos de salário ou melhores condições de trabalho reduzem. Ninguém quer perder seus clientes, logo as negociações com fornecedores ficam mais suaves. A prioridade é inequivocamente sobreviver, logo toda e qualquer conversa de desenvolvimento e motivação cai de prioridade. A crise, de uma certa forma, faz brilhar executivos com competências mais hard – com mais foco no curto prazo, na tarefa, no caixa.

Nestes momentos, queremos executivos com capacidade de tomar decisões impopulares de forma rápida e ousada, sem hesitação. E, veja bem, executivos como esses são essenciais para qualquer empresa, mas, quando a crise começa a passar, eles têm que sair do holofote central e seu poder precisa ser balanceado com outros conjuntos de competências.

NO FIM DA TEMPESTADE, NÃO É HORA DE RELAXAR. É HORA DE EXERCITAR OUTRAS HABILIDADES.

A grande velejadora Jeanne Socrates, lenda da navegação solo, fala claramente que na hora que passa uma grande tempestade é hora de:

(1) checar sua posição e refazer seus planos de navegação,

(2) fazer contato com a base, comunicar sua posição, direção e estado físico e mental,

(3) checar se todos os sistemas a bordo estão funcionando, fazer os reparos necessários,

(4) limpar e arrumar o barco, tomar banho, colocar roupas limpas, restabelecer a rotina de descanso e alimentação e

(5) reunir a tripulação e checar como eles estão e perguntar o que funcionou durante a tempestade, o que não funcionou e o que faremos diferente da próxima vez – que estratégias, táticas, equipamentos e sistemas funcionaram e quais não funcionaram.

A IDEIA É QUE CADA TEMPESTADE NOS TORNE MAIS FORTES E CAPAZES DE ENFRENTAR A PRÓXIMA.

A metáfora é tão óbvia que dá um pouco de vergonha de analisar, mas é importante ser didático aqui. Primeiro porque envolve sobrevivência e, em segundo, porque este momento depois da tempestade é essencial para a competitividade de uma organização. Não vence a corrida quem sobrevive à tempestade. Vence a corrida quem se reorganiza primeiro para encarar o futuro.

E este é um momento importante. Por vários motivos…

1. É hora de reconhecer quem fez. E alimentar o orgulho de pertencer.

Dá um prazer enorme ter sido capaz de sobreviver a uma tempestade. Se você se percebe como protagonista, se você consegue perceber o quanto você foi importante para a organização passar pelo momento difícil, isto gera uma sensação de autoestima elevada, de pertencimento, de mérito. O senso de engajamento com a organização aumenta muito!

É um momento importante de reafirmar os vínculos com sua equipe. De reconhecer seus méritos. É hora de distribuir medalhas para os heróis. E também é hora de separar o joio do trigo. Aqueles que não cresceram, que se encolheram, que fizeram peso em vez de lutar bravamente, devem ser trocados. Este é, provavelmente, o melhor momento para fazer boas trocas. Todos vão entender, quem ficar vai se sentir valorizado, e o senso de equipe tende a sair fortalecido. Ninguém gosta de covardes…

2. É hora da reconstrução (e de mudar, de inovar)

Algumas mudanças são difíceis porque o custo de mudar é muito alto quando estamos em situação de conforto. Logo depois de uma tempestade, com a lembrança fresca de quanto um sistema adequado, um processo bem azeitado, um equipamento ou um treinamento nos fizeram falta numa hora crítica, é uma ótima hora para comprar brigas históricas e transformar aquilo que sempre tivemos preguiça ou medo de mudar. É hora de botar o mastro abaixo e refazer o sistema de velas. É hora de desaparafusar todos os equipamentos da cabine e reavaliar sua posição. É hora de rever os sistemas de navegação e repensar a forma como reagimos aos alertas. É hora de inovar, de experimentar o novo.

UMA BOA TEMPESTADE TORNA UM BARCO MAIS COMPETITIVO E UMA TRIPULAÇÃO MAIS ESPERTA, SE (APENAS SE) CONVERTERMOS EXPERIÊNCIA EM APRENDIZADO.

3. É hora de definir novas metas

Passada a tempestade, precisamos de um rumo novo. Sobreviver é legal, mas só faz sentido de verdade se tiver um porquê. Esta é a hora de traçar objetivos novos. Hora de aproveitar a força e a coragem recém-descobertas para estabelecer metas ousadas, que talvez antes soassem como irreais, mas que agora são perfeitamente factíveis.

É claro que isto só vai acontecer se as pessoas comprarem o porquê. Ninguém vai sair para o mar de novo e se arriscar por nada. Não é esporte, é negócio. É hora de ser sério, estabelecer uma nova visão, conectar com as pessoas e deixar claro quais são os benefícios para elas da nova fase.

4. É hora de criar novos rituais

Grandes equipes têm seu próprio conjunto de rituais.

Os All Blacks, o mítico time de Rugby neozelandês, apavora seus adversários com uma haka tribal. A tropa de elite Seal americana insere os pins de formatura dos novos recrutas na pele por baixo da camisa, em um ritual que acontece dentro do quartel, longe dos olhos de estranhos. Quando um Yakusa comete um erro grave, ele corta um de seus dedos em um ritual chamado Yubitsume. Isto serve como pedido de desculpas e como demonstração de fidelidade e compromisso com seu clã. Um adolescente Masai, antes de ser circuncidado e entrar para o mundo dos adultos, tem que ser capaz de manter um rebanho reunido por 7 dias e 7 noites, sozinho.

GRANDES EMPRESAS TAMBÉM TÊM SEU PRÓPRIO CONJUNTO DE RITUAIS.

Sinos que sinalizam vendas realizadas. Reuniões em pé com a empresa inteira para debater aquilo que é crítico para todos. Festas de celebração por resultados atingidos. Encontros em locais inspiradores para definir planos e metas. Lançamentos bombásticos de campanhas de vendas. Convenções de franqueados com palestrantes célebres. Dias reservados para aprendizado ou desenvolvimento de inovações. Viagens de integração até a sede para receber as bênçãos do fundador. Além de bandeiras, hinos, logos, marcas…

RITUAIS, ASSIM COMO SÍMBOLOS E SIGNOS, SÃO ÚTEIS PARA NOS RECONECTAR COM A CULTURA E UNS COM OS OUTROS. ELES NOS FAZEM LEMBRAR. LEMBRAR QUE EXISTE ALGO ALÉM DE OITO HORAS DE ESFORÇO POR DIA E UM SALÁRIO NO FIM DO MÊS.

Momentos marcantes, como o fato de que sobrevivemos uma tempestade juntos, merecem um ritual, um símbolo, um signo, do que vivemos juntos. Pode ser muito útil no futuro, quando o senso de propósito fraquejar e nos pegarmos entediados e medíocres de novo…

Em resumo, boas tempestades fazem bons marinheiros. Boas batalhas fazem bons guerreiros. Experiências de superação em equipe fazem excelentes equipes. Quando isto acontece, é papel da liderança converter esta experiência em aprendizado, e canalizar esta nova energia em desempenho no futuro, fora da tempestade.

AFINAL, SOFRER SÓ É ÚTIL QUANDO APRENDEMOS ALGO COM ISTO. SE NÃO, É SOFRER À TOA.

Superando a tempestade

Para ilustrar todos os pontos que comentamos acima, quero compartilhar a experiência que tive como mentor de uma empresa que viveu uma situação semelhante.

A crise econômica brasileira tinha batido forte. Depois de anos crescendo 50% ao ano, seus consumidores tinham perdido seus empregos e deixado de pagar suas dívidas. O fantasma da inadimplência batia na porta.

Mas não era a primeira tempestade que eles atravessavam. Os alarmes soaram e a atenção da empresa foi imediatamente direcionada para a área de recuperação de crédito. A presidente trouxe a área para perto de si e começou a ter relatórios diários de seu desempenho. Outras medidas de austeridade foram tomadas, como redução de equipes e demissões em todos os níveis.

Foram medidas acertadas, duras, e a empresa atravessou a tempestade com sucesso, recuperando uma quantidade importante de créditos concedidos por ter se movido mais rápido e mais intensamente que os outros. Mas, um preço foi pago.

Quando nos reunimos pela primeira vez, os empreendedores estavam preocupados com o engajamento dos funcionários e com a capacidade da liderança de fazer uma nova mudança acontecer. Eles descreviam uma empresa desgastada, com a energia baixa. Fui para lá escutar as pessoas in loco e entender por onde faríamos a curva.

O diagnóstico foi simples: a empresa estava em “modo navegação na tempestade”. O poder tinha se concentrado quase 100% nas mãos do timoneiro (guia) e as ações estavam quase 100% focadas no aqui e agora. Os líderes se sentiam sem direção, e as pessoas estavam executando cegas o que lhes era comandado. O cansaço em todos os níveis era visível. Se de um lado, isto tirou a empresa da crise, do outro isto impedia que ela agora se ajustasse adequadamente aos ventos mais brandos e às novas oportunidades que surgiam. Estava na hora de baixar a ansiedade, respirar e pensar no novo caminho.

A primeira grande ação foi um novo Planejamento Estratégico, seguido de um investimento em um novo modelo de gestão, ancorado em KPIs em todos os níveis. Todos os líderes foram treinados para lidar bem com o novo modelo.

A segunda grande ação foi repensar a forma de voltar ao mercado. Voltar a crescer sem aumentar o risco virou prioridade na pauta, e novas competências de desenvolvimento a partir das necessidades do consumidor começaram a ser praticadas. E o terceiro movimento foi fortalecer a liderança, via ações de desenvolvimento pessoal, para que eles entendessem seu papel neste novo momento, individual e coletivamente. Ao mesmo tempo que o combate à inadimplência foi mantido.

Foi um grande movimento, conduzido com a mesma firmeza e velocidade que a empresa lidou com a crise. A empresa sai mais forte da tempestade e aponta resoluta para uma nova direção. Bonito de ver.

Aposto no seu futuro!

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