Por: Arthur Rosa
Comerciantes e credenciadoras de cartões estão em lados opostos nos tribunais para discutir quem deve suportar os prejuízos gerados por fraudes no comércio eletrônico. Apesar de constar nos contratos que a conta deve ficar com os lojistas, tribunais estaduais têm entendido que as credenciadoras, que autorizam as vendas, não podem se furtar de assumir os riscos inerentes ao negócio.
O grande volume de compras não reconhecidas é um dos principais motivos para o fechamento de lojas on-line no país. Só em 2014 foram R$ 500 milhões em prejuízos, de acordo com estimativa da Serasa Experian.
Em recente decisão, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) manteve sentença que considerou abusivas cláusulas contratuais e condenou a Redecard (atual Rede) a pagar R$ 53,7 mil a um lojista, referentes a compras não reconhecidas por um titular de cartão.
O relator do caso na 11ª Câmara Extraordinária de Direito Privado, desembargador Felipe Ferreira, considerou que as vendas foram autorizadas e não havia justificativa para serem recusadas pelo lojista. “A recorrente [Redecard] não nega ter autorizado a venda, de modo que se mostra incabível a posterior recusa de pagamento e a tentativa de classificar a conduta da comerciante como desidiosa”, diz o magistrado no acórdão.
Em sua defesa, a Redecard alegou que a loja tinha condições de evitar as transações irregulares. E deveria ter desconfiado de um aumento abrupto de faturamento. As compras, de quase R$ 60 mil, foram realizadas por uma única pessoa, em um curto espaço de tempo.
A credenciadora argumentou ainda que as cláusulas sobre o chamado “chargeback” – procedimento adotado quando uma compra não é reconhecida pelo titular – foram estabelecidas para a proteção do mercado de cartões.
Porém, para o desembargador Francisco Giaquinto, relator de um outro processo, julgado pela 13ª Câmara de Direito Privado do TJ-SP, deve ser aplicado a esses casos a teoria do risco da atividade, prevista no artigo 927 do Código Civil. “Ao prestarem serviços auferindo lucros e vantagens, os fornecedores assumem o risco inerente à sua atividade”, afirma o magistrado na decisão, que negou provimento a recurso da Cielo.
Para a advogada Elisa Mombelli, especialista em direito digital e sócia do Assis e Mendes, a conta deve ficar mesmo com as credenciadoras. “As atividades de concessão de crédito e de processamento de pagamentos são de risco. Portanto, os riscos envolvidos nessas operações devem ser assumidos por quem autoriza as transações, e não pelos lojistas”, diz.
Há também precedentes a favor das credenciadoras. Decisões que determinam simplesmente o cumprimento dos contratos ou que levaram em consideração o fato de os lojistas terem sido negligentes, autorizando vendas com cadastros incompletos ou sem checar dados fornecidos por compradores.
Em um dos casos, a 16ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) considerou que, mesmo diante de forte suspeita de ocorrência de fraude, o lojista “ainda assim optou por concretizar as vendas, ou seja, assumiu o risco, pois o fato de ter informado à demandada [Cielo] sobre sua suspeita, por si só, não a exime do cumprimento contratual”.
“A tese das credenciadoras é exatamente essa, de que a averiguação das informações transmitidas no ambiente virtual do estabelecimento comercial deve ser feita pelo próprio lojista”, afirma o advogado Adriano Boschi Melo, do escritório Pires & Gonçalves Advogados Associados, que representa a Cielo.
Por nota, a Cielo esclareceu que “segue as regras determinadas pelas bandeiras – responsáveis pela organização e pelo estabelecimento das normas que regem as operações dos participantes da indústria de meios de pagamento no mundo”. E que “investe constantemente e cada vez mais em inovação e tecnologia”.
Já a Rede informou que “o mercado de credenciamento de lojistas para o recebimento de cartões é regulado por leis, contratos e normas das bandeiras”. E que “o estabelecimento é responsável pelo não reconhecimento de compras com cartões realizadas em seu site. É importante destacar que essa condição consta do contrato e é de conhecimento do lojista”.
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