No ano passado, a Anatel permitiu a fidelização na TV a cabo com a Resolução 632/2014. Quer dizer, a empresa pode me oferecer um serviço mequetrefe, que nem me interessa, por três meses e sou obrigada a ficar fiel por 12 meses?
Por: Nadja Sampaio
A arte de enganar o consumidor não é apenas oriunda das cabeças movidas pelo lucro fácil das empresas, as agências reguladoras compartilham com este modelo de negócio quando tornam as regras favoráveis às vendas enganosas e praticamente “escondem” a saída que o consumidor teria para fugir do abuso. Historicamente, na área de TV a cabo, a regulação da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) é propensa a validar os abusos das companhias. Quem se lembra da briga pela cobrança do segundo ponto?
Estou cancelando um contrato de TV a cabo e contratando outro pacote com a mesma empresa. Portanto, estou passando por todos os dissabores ao mesmo tempo agora. Primeiro foi a aporrinhação para conseguir cancelar. Quando a pessoa consegue passar por todas as fases do menu, sem que a ligação caia e, finalmente fala com um atendente, normalmente a pessoa diz que o sistema está fora do ar e manda você ligar mais tarde. Na terceira tentativa, o atendente te ouve. Depois que consegue, firmemente, convencê-lo de que não quer mais o serviço, ele dá o protocolo de cancelamento e você se sente um vencedor de uma maratona.
Mas, eles não cortam logo o sinal e a gente fica preocupado de que sejam cobrados estes dias, o que geraria mais reclamação. Liguei de novo para o cancelamento, passei por todo o calvário, e falei com a atendente que não vou pagar se me for cobrado a mais. Cancelei o serviço no dia 29 de dezembro, mas o sinal só foi cortado no dia 10. Estou esperando a próxima fatura para ver se será preciso brigar de novo. Sim, porque o motivo deste cancelamento é que estou, desde novembro, lutando para me livrar de uma cobrança indevida de dois serviços de assistência técnica que não contratei. Todos os meses reclamo da cobrança e peço o ressarcimento. No mês seguinte, eles descontam do mês anterior e cobram de novo. E, obviamente, não devolvem em dobro, como manda o Código de Defesa do Consumidor com relação à cobrança indevida.
Contratei um pacote para o quarto que fica no sexto andar do meu prédio. As empresas de TV a cabo, não permitem que se assine dois contratos no mesmo endereço, o que eu acho um absurdo. Há casos em que as pessoas dividem um imóvel e poderiam querer fazer contatos separados. No meu prédio, todos os apartamentos têm direito a um quarto no último andar. Como moro no primeiro andar e este quarto é no sexto, as empresas não aceitam que seja um ponto do contrato do apartamento. Tentei fazer outro contrato só para o quarto, mas não pode porque o endereço é o mesmo. Então tive que cancelar um para fazer o outro.
Contratei pelo chat do site da empresa e me deparei um com mar de abusos. Pedi o menor pacote, com 126 canais, R$ 120 a adesão, e como não aceitei colocar a cobrança em débito automático, a mensalidade teria um acréscimo de R$ 10, indo para R$ 89,90. Argumentei que já tive que brigar outras vezes por cobranças indevidas e por isso o meu temor de colocar no débito automático. Ela reafirmou que era assim e ponto. Depois ela falou que eu teria dois equipamentos para dois pontos. Expliquei que era um quarto e por isso não eram necessários dois equipamentos, portanto, se eu não ia utilizar dois pontos, o pacote poderia ser mais barato. Novamente ela disse que era assim e ponto.
Depois ela disse que eu receberia, grátis, por dois meses, dez canais de HBO MAX e três canais de Telecine, e por causa disso, há uma fidelização de doze meses e a multa pela quebra de contrato é de R$ 108,25 por cada mês remanescente. Afirmei que é proibido ter fidelização em contratos de TV a cabo. Ela disse que todos os contratos tinham fidelização e não era possível tirar. E mandou: Confirma a contratação? Ou seja, ou eu engulo este mar de irregularidades ou desisto de ter o serviço. Contratei. No dia da instalação dispensei o segundo aparelho, mas agora resolvi que o quero e vou colocá-lo de enfeite. Nem que seja para a empresa não poder usá-lo, já que me obrigam a pagar pelo seu aluguel.
Instigada pelo assunto, fui pesquisar a legislação. Aí foi que fiquei indignada mesmo. No ano passado, a Anatel passou a permitir a fidelização na TV a cabo com a Resolução 632/2014. O artigo 57 diz que “a prestadora pode oferecer benefícios ao consumidor e, em contrapartida, exigir que permaneça vinculado ao contrato de prestação de serviço por um prazo mínimo de 12 meses”.
Quer dizer, a empresa pode me oferecer um serviço mequetrefe, que nem me interessa, por três meses e sou obrigada a ficar fiel por 12 meses? No parágrafo quarto, vem a ressalva: “caso o consumidor não se interesse pelo benefício oferecido, poderá optar pela adesão de qualquer serviço, não sendo a ele imputada a necessidade de permanência mínima”. Bem, a atendente não aceitou que eu dissesse que não queria o benefício. Era pegar ou largar. Como o consumidor se sai dessa?
E mais, o artigo 58 diz que rescindido o contrato antes do final do prazo, “a prestadora pode exigir o valor da multa estipulada, a qual deve ser proporcional ao valor do benefício e ao tempo restante para o término do prazo de permanência”. Bem, no meu caso, se eu resolver desistir logo após acabar o “benefício” que a empresa está me dando, a multa de fidelização seria de R$ 866. Muito caro para ter três meses de filme e 10 canais HBO, vamos combinar. É claramente abusivo. Mas, obviamente, a Anatel não fiscaliza estes contratos.
Comentando o caso com uma amiga, ela falou sobre uma palestra que ouviu na ESPM, na qual o palestrante afirmou que o negócio de TV a cabo está acabando, como acabou o aluguel de DVDs, pois todo mundo está baixando filmes na internet. Fiquei pensando: então é por isso que a minha banda larga diminui no horário em que mais há demanda de filmes. Será que diminuem o sinal para a parte da internet da empresa não matar o negócio de TV a cabo? Mas, em todos os casos, quem sofre é consumidor com as pegadinhas das TVs a cabo e conivência da reguladora.
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