Análise dos métodos utilizados pela maior startup brasileira para tornar-se encantadora num setor marcado por insatisfação
Por: Rodolpho Moreira Neto
Embora tenham sido criados com o propósito de facilitar a vida humana, a verdadeira essência dos serviços financeiros é dar dor de cabeça naqueles que os utilizam. Apesar de muitos serem capazes de entender o capital e suas minúcias, são poucos os que apreciam sua discussão: ninguém vai ao happy hour do trabalho ou comparece a reunião de família visando discutir taxas de juros, alavancagem, leasing, consórcio ou qualquer outro dos variados temas e artíficios que nos são disponibilizados pelas instituições financeiras.
Um famoso recurso que essas entidades nos oferecem é o cartão de crédito, uma criação (como a maioria dos inventos capitalistas) norte-americana que permite aos clientes adquirirem produtos e/ou serviços a crédito. Hoje, quase cem anos após sua invenção, o cartão é concedido por alguns (muitos) bancos, recebendo suporte de algumas (muitas) bandeiras, que nos ofertam múltiplos arquétipos de produto, os quais a maioria de nós não distingue muito bem: gold, platinum, gold 2.0, platinum fidelidade… O leque é tão amplo quanto a abrangência de cores: dourado, cinza, azul, branco, um bizarro arco-íris que geralmente só é entendido por aqueles que o vendem.
Contudo, nos últimos tempos, mesmo vivendo nesse setor pouco glamuroso que é o crediário, uma empresa vem chamando atenção por algo raríssimo no meio: a alta performance do serviço e qualidade do atendimento. A Nubank, startup fundada em 2013 pelo colombiano David Velez, vem se consolidando no mercado nacional em acelerada ascensão – em parte devido ao aporte de mais de duzentos milhões de reais feito por investidores, (mas muito mais importante) em parte devido ao excelente serviço prestado já antes desse subsídio.
Em um rápido resumo, o Nubank é um serviço completamente digital, e usufrui dessa condição para ofertar uma comodidade que o restante do mercado não disponibiliza para o consumidor: anuidade inexistente, taxa de juros menor que a média nacional, burocracia reduzida (para não dizer inexistente); ou seja, o cartão poupa aquilo que é mais importante para o cliente: tempo, dinheiro e estresse. Gerenciado através de um aplicativo, não é novidade que o cartão Nubank é um produto disruptivo. O que intriga é como a marca segue em evidência no mercado – algo que “apenas” uma boa mercadoria não justifica. Entretanto, é isso (sua singularidade) que coloca o cartão naquele que é o melhor tipo de propaganda: o boca a boca.
Como foi supracitado, a maioria das pessoas detesta falar sobre o dinheiro e suas nuances. A pecúnia não é empolgante como debater esportes, músicas, filmes ou seriados; traz a tona problemas que muitos tentam esquecer (dívidas crescentes, frustração); e ativa gatilhos que tornam o tema ainda mais desagrádavel: corrupção, furtos, desigualdade social. Além disso, o cartão de crédito em si só foi revolucionário à época de sua invenção. Sem novidades, torna-se um assunto pouco estimulante para merecer participar de uma conversa.
Eis que surge o Nubank, tornando acessível um cartão de crédito que conseguiu uma incrível façanha: gerar um bate boca. E não apenas imediato, mas contínuo. E fez isso obecendo a algumas leis fundamentais do contágio:
Moeda social
Graças ao renome obtido em pouco tempo, o cartão passou a ser cobiçado por um invejável número de pessoas – algumas centenas de milhares. Isso foi mais do que podia ser inicialmente atendido, de forma que criou-se uma colossal lista de espera formada por pessoas que pleiteavam o cartão. Nessas condições, tornou-se cool ser cliente Nubank: as pessoas que estavam entrando passaram a fazer parte de um seleto grupo de clientes, uma “casta” na qual milhares de pessoas almejam entrar. E esse status descolado fez quem detinha o cartão divulgá-lo: falando sobre ele, mostrando-o, apresentando seus diversos benefícios a quem quer que seja, em qualquer lugar.
E o Nubank, que bem sabe do poder desse artíficio, criou um mecanismo que potencializa esse know-how: o processo de análise de crédito é facilitado se alguém que já é cliente indicar alguém de fora para entrar. Se um vasto número de pessoas almeja entrar para um grupo distinto e sou parte desse grupo, é muito provável que eu vá querer me gabar disso. O Nubank acabou por cunhar uma forte moeda social, a qual não se troca em nenhuma casa de câmbio: o privilégio do cliente gabar-se pelo simples fato de ser cliente.
Emoção
Talvez o maior mérito – mais do que desenvolver um bom produto – do Nubank tenha sido desenvolver um atendimento humanizado. Toda a cultura da empresa traduz as ações em experiência – ou seja, transformar o rotineiro uso de um cartão de crédito numa experiência que possa ser compartilhada. Os atendentes Nubank, denominados Xpeer, são empoderados a resolver casos de uma maneira que não apenas solucione o problema do cliente, mas que crie o chamado ‘wow factor’: o algo a mais que irá, mais do que satisfazê-lo, encantá-lo.
Diante dessa orientação, os colaboradores da empresa são desestimulados a certas práticas que são alvo constante das críticas dos consumidores: transferir ligações, dar prazos sem intenção de cumpri-los… O incentivo é feito para que se assuma a responsabilidade pela adversidade pela qual o cliente passa; afinal, o serviço é 100% digital, e se ele não conseguiu resolver seu problema pelo aplicativo, é porque algo de maior gravidade ocorreu. Sendo assim, para criar uma história “digna de nota” (ou melhor dizendo, digna de ser postada no Facebook), o objetivo é distinguir-se no atendimento – e hoje essa divisão é a maior da Nubank.
Histórias
Nessa concepção de encantamento, vários relatos do time de atendentes Nubank tornaram-se famosos: o envio de cartas escritas à mão, despacho de presentes diversos, recomendações para viagens… A missão da empresa é tornar a vida dos seus clientes mais fácil, e valores se refletem através de práticas, não só de discursos e declarações – como cumpre bem essa premissa, a companhia é recompensada com uma propaganda feita por clientes cativados, direcionada para um número cada vez maior de clientes insatisfeitos com seus bancos/cartões de crédito.
Gatilhos
Gatilhos são coisas, episódios e sensações que nos fazem lembrar de outras coisas, episódios e sensações. Outro gol de placa marcado pelo Nubank foi criar uma porção deles. É muito provável que, se neste artigo a palavra Nubank tivesse sido substituída por empresa do cartão de crédito roxo, ainda assim a maioria dos leitores soubesse de que firma se tratava. Enquanto os outros bancos oferecem cartões em variadas cores, a “empresa do cartão roxo” é assim reconhecida por deter o cartão apenas nessa cor. Roxo é Nubank, que se destaca também por gatilhos em forma de palavras: tarifa – gratuito – taxa de juros – startup – digital. Tudo isso pode, de alguma forma, remeter ao cartão roxo que não cobra anuidade por ter custos baixos devido a seu formato digital.
Valor Prático
A moeda social, a emoção, as histórias e os gatilhos só foram agregados ao Nubank em decorrência de um fator: a criação – e manutenção – de um serviço baseado na qualidade. A base de clientes Nubank é constituída, em sua maioria, pela fatia mais jovem das pessoas economicamente ativos. É claro: as gerações mais novas detestam bancos; o Nubank não tem sede fixa. Você não precisa comparecer presencialmente para realizar os serviços que teria que consumir tempo num espaço que detesta em todos os outros bancos, como alterar o limite de crédito e solicitar autorização para compras no exterior. A coisa que cartões de crédito fazem melhor é dar dor de cabeça nos seus usuários. Mas o Nubank oferece a melhor experiência (não a menos ruim) imaginável no meio.
Sobretudo, o serviço é econômico: não há anuidade cobrada, as tarifas são mais baixas do que a média mercadológica e mesmo em caso de perda do cartão, não há cobrança de segunda via. Aliando o barateamento há um serviço personalizado para um produto simples, o Nubank distingue-se de tudo aquilo que é clichê na maioria das indústrias brasileiras: burocracia excessiva; cobranças elevadas; descaso com o consumidor; mix confuso de produtos.
Um motivo para o Nubank tornar-se atraente é simples: é porque ele é melhor. Mas sua continuidade na mídia se deve ao zelo com sua missão: “reduzir a complexidade que encaramos todos os dias ao lidar com nosso dinheiro”.
Mais do que uma alternativa de qualidade para serviços burocráticos, o Nubank é também uma esperança, que traz a prova de que mesmo nos mercados mais cimentados ainda há lacunas que podem ser convertidas em demanda. Ao aliar um serviço digital com o maior mercado do Brasil, o Nubank provou ser uma empresa de tecnologia muito mais de que uma de cartão de crédito – este é apenas seu meio.
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