Por: Cristiane Lucchesi, Francisco Marcelino e Filipe Pacheco
Os bancos brasileiros, entre eles o Itaú Unibanco e o Bradesco, devem evitar usar a maior parte dos R$ 70 bilhões que o governo colocou à disposição para estimular o crédito e a economia.
“Estamos fazendo o máximo possível de crédito, mas existem situações que não estão tendo demanda. E a gente ouve falar muito que o empresariado está cauteloso, que o consumidor está cauteloso”, disse Domingos Figueiredo de Abreu, vice-presidente-executivo do Bradesco, em entrevista por telefone, da sede da empresa, em Osasco.
Depois que a economia mergulhou em uma recessão, no primeiro semestre de 2014, o Banco Central eliminou R$ 70 bilhões em depósitos compulsórios e exigências de capital para acelerar o crescimento do crédito, que caiu em julho para 11% em uma base anualizada, o nível mais baixo desde 2004.
Essas medidas poderiam aumentar o crédito em até R$ 310 bilhões, segundo dados compilados pela Bloomberg, dando um impulso à presidente Dilma Rousseff na corrida para as eleições do mês que vem.
Mesmo com os fortes incentivos, os bancos estão resistindo a aumentar o crédito. Entre esses incentivos está o fim da remuneração de 11% que eles recebiam sobre os R$ 40 bilhões em compulsórios depositados no BC.
Agora, os bancos podem receber um retorno zero sobre esse dinheiro ou usá-lo para financiar a compra de carros e motos, adquirir carteiras de crédito ou letras financeiras de bancos menores.
Empréstimos automotivos
“O problema é que a demanda para compra de veículos não está aquecida atualmente”, disse Paulo Duailibi, chefe de produtos de varejo do banco Santander Brasil SA.
“Como a alternativa é não receber nenhum retorno, estamos oferecendo empréstimos para as montadoras com taxas de juros muito atrativas”, às vezes mais baixas que a taxa Selic, do BC, o que permite que as empresas automotrizes ofereçam taxas de juros zero aos consumidores, disse ele.
Bradesco, Itaú, e Santander reduziram suas taxas de juros para empréstimos automotivos. O crédito para pessoas comprarem veículos caiu 4,5% em julho em relação ao mesmo mês do ano passado, para R$ 185,2 bilhões, segundo o BC.
“É improvável que o BC consiga estimular os bancos grandes a comprarem carteiras de crédito dos menores”, disse Antonio Hermann de Azevedo, diretor-executivo do banco BMG.
Compra de créditos
“Os bancos não vão comprar carteira de crédito depois dessas medidas, porque não tem muito portfólio para adquirir”, disse ele, em entrevista por telefone. Os bancos médios reduziram os empréstimos com a desaceleração da economia e para manter a inadimplência sob controle, disse Azevedo.
O BMG, que tem sede em São Paulo, possui 40% de uma joint venture de empréstimos consignados formada com o Itaú em 2012.
O Itaú não quis comentar se as medidas do governo vão alterar sua projeção de crescimento para o crédito neste ano. O banco estima que sua carteira de empréstimos aumentará para algo próximo de 10% neste ano, disse Marcelo Kopel, diretor de relações com investidores, no dia 5 de agosto, em teleconferência sobre lucros com repórteres.
O Bradesco mantém sua projeção de crescimento do crédito entre 10% e 14%, disse Abreu. O presidente Luiz Carlos Trabuco Cappi disse, após o anúncio das primeiras medidas do BC, em julho, que o banco poderia ampliar o crédito em R$ 10 bilhões usando os recursos liberados. Mas, segundo ele, o aumento não seria imediato.
Empréstimos do Itaú
O crédito total concedido pelo Itaú cresceu 11% no segundo trimestre em relação ao ano anterior, para R$ 518,4 bilhões, segundo seu balanço mais recente. A carteira de empréstimos do Bradesco cresceu 8,1%, para R$ 435,2 bilhões, enquanto os empréstimos do Santander aumentaram 4,9%, para R$ 279,7 bilhões.
“Os bancos têm uma certa reticência em aumentar a exposição a linhas de crédito mais arriscadas. A gente está no meio de um processo de eleições, com uma visão econômica diferente de cada candidato. Ao mesmo tempo, há dados do mercado de trabalho que são mais fracos. Começa a se ver fragilidade no mercado de trabalho”, disse Carlos Macedo, analista do Goldman Sachs Group Inc. em Nova York, em entrevista por telefone, em 25 de agosto.
“A gente ainda vê o crédito automotivo encolhendo, com a aversão dos bancos a linhas mais arriscadas e com o foco nas linhas menos arriscadas, como o crédito imobiliário e o consignado”, disse Macedo. “O desemprego vem em uma curva de baixa desde 2004. E se olhar para 2015, tem-se uma possibilidade de aumento do desemprego. Se isso se converter em desemprego, pode haver problema de inadimplência”.
“O nível de endividamento das famílias, os gastos com o serviço da dívida, está indo na casa dos 20%. É um nível bastante alto”, disse ele. “Os empréstimos ao consumidor crescerão apenas se o produto interno bruto acelerar”.
As medidas de estímulo ao crédito do governo são negativas para o risco de crédito dos bancos porque reduzem as proteções ao capital e estimulam o empréstimo para empresas pequenas e consumidores de risco mais alto em um momento em que a economia está enfraquecendo, a inflação é persistente e a criação de empregos é limitada, disseram analistas da Moody’s Investors Services em um relatório, em 25 de agosto.
“O próximo ano deve ser um ano de ajustes. Portanto, acredito que ainda não será um ano de forte recuperação do crédito”, disse Carlos Kawall, economista-chefe do banco J. Safra e ex-secretário do Tesouro.
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