Por: Felipe Marques
Se é normal os especialistas em finanças pessoais aconselharem distância do cheque especial e do rotativo do cartão de crédito, não deixa de ser surpreendente que os próprios bancos passaram a engrossar o coro dessa recomendação. “Minha meta para os próximos anos é reduzir a carteira de cheque especial e de crédito rotativo no banco”, afirma Raul Moreira, vice-presidente executivo de varejo do Banco do Brasil (BB). “Em 2015, o cheque especial já caiu, mas o rotativo andou de lado. Neste ano, os dois vão cair”, afirma.
Não é apenas o banco público que passou à condição de desestimulador do produto. Campanhas publicitárias e declarações de representantes de Itaú Unibanco, Bradesco e Santander mostram que existe um movimento para repensar a relação de seus clientes com as mais caras linhas de crédito bancário para pessoa física – o rotativo do cartão, por exemplo, tem taxas de juros que ultrapassam os 400% ao ano.
Longe de ser uma bondade, incentivar a redução do uso do rotativo e do cheque especial, linhas em que a margem dos bancos é alta, tem uma justificativa econômica. Com o bolso das famílias cada vez mais apertado e o desemprego em alta, a conclusão dos bancos é que, se quiserem manter os índices de inadimplência na pessoa física sob controle, terão também que controlar o endividamento de seus clientes nas linhas emergenciais.
No acumulado de 12 meses encerrados em fevereiro, o estoque de cheque especial cresceu 2,5%, para R$ 27,4 bilhões. O rotativo do cartão, por outro lado, avançou 16,7% no mesmo período, para R$ 36,87 bilhões. No cheque especial, a taxa média de juros estava em 294% ao ano em fevereiro. No rotativo, em impressionantes 447,5% ao ano. Criticados pelo custo elevado dessas linhas, os bancos argumentam que a taxa de juros cobrada é reflexo dos altos níveis de inadimplência e da falta de garantias nesse tipo de operação.
“Nossos modelos estatísticos mostram que o cliente que fica muito tempo no rotativo não costuma ser rentável”, afirma Adriano Pedroti, diretor de crédito e cobrança no Itaú Unibanco, o maior emissor de cartões do país. Segundo ele, não só é alta a chance de o cliente “recorrente” do rotativo deixar de pagar essa fatura, como também os demais produtos que contratou com o banco, ampliando o prejuízo. No fim das contas, o banco também acaba perdendo um cliente, e com ele se vai um potencial futuro de receitas.
A avaliação de Moreira, do BB, é que o incentivo à redução das linhas de maior risco foi um dos fatores que explicam a queda da inadimplência pessoa física do banco em 2015. O indicador de empréstimos em atraso do banco recuou de 2,3% para 2,17% ao longo de 2015.
O BB mudou até a remuneração dos gerentes para fazer o plano funcionar. Desde o ano passado, o rotativo e o cheque especial deixaram de entrar na conta dos volumes das agências para fins de remuneração. O banco só recompensa seu funcionário por cheque especial se for um limite novo, concedido para abertura de conta.
Em 2015, o saldo de cheque especial do banco encolheu 1,2% no acumulado em 12 meses encerrados em dezembro, para R$ 2,3 bilhões. Já a carteira de operações no cartão de crédito cresceu 6% no período, a R$ 22,15 bilhões. O banco não divulga no balanço quanto dessa carteira são operações de rotativo.
O presidente do Santander, Sérgio Rial, também abordou o produto. Na divulgação de resultados anuais do banco, o executivo afirmou que “deixar o cliente no cheque especial hoje é inviável”. “Ninguém tem interesse em ter cliente inadimplente no cheque especial”, disse. O banco espanhol não divulga o tamanho de seu portfólio dessa linha.
O Itaú decidiu encampar uma campanha publicitária em que prega o uso do cartão de crédito como uma “solução, não como um problema”. A série de esquetes inclui também um programa sobre o que é o cheque especial – “indicado para imprevistos e períodos curtos”. O estoque de financiamento no cartão de crédito do banco caiu 1,3% no acumulado em 12 meses encerrados em dezembro, para R$ 58,5 bilhões.
Segundo Marcos Magalhães, diretor de cartões do Itaú, o banco já vinha fazendo um movimento nos últimos anos para evitar o uso recorrente do rotativo, mas resolveu reforçar a mensagem agora, em um momento em que os clientes têm demandado mais a linha. “No longo prazo, temos a preocupação de evoluir outras linhas para diminuir o rotativo. É um produto que, em uma economia estável, teria que ser repensado completamente.”
Marcelo Noronha, presidente da Associação das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços (Abecs) e responsável pela área no banco Bradesco, afirmou recentemente que o rotativo “tem manchado a imagem do setor e estamos trabalhando para mudar essa linha”.
O discurso dos bancos também tem correlação com as elevadíssimas taxas de inadimplência nessas modalidades. O percentual de operações do rotativo do cartão de crédito que estão inadimplentes há mais de 90 dias encerrou fevereiro em 35,8%, depois de bater 40,5% em dezembro do ano passado. No cheque especial, a taxa de calotes saiu de 18,1% em dezembro para 16,2% em fevereiro – ante 13,7% um ano antes.
Não custa lembrar também que os bancos brasileiros, até 2019, terão que ter um capital cada vez maior para fazer frente a operações de créditos mais arriscadas. Esse é outro fator que explica a impopularidade recente do produto entre seus criadores. (Colaboraram Aline Oyamada e Vinícius Pinheiro)
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Se os bancos querem diminuir a inadimplência basta baixar os juros a níveis aceitáveis internacionalmente !!!
Tão simples!
Dá vergonha morar num país com juros tão escorchantes!
E a culpa é toda dos bancos!