Por: Elisa Soares
O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) continua firme no objetivo de reduzir o volume de recursos desembolsados este ano, na comparação com 2013, quando as liberações foram recorde, R$ 190,4 bilhões. E mantém planejamento “muito forte” de abrir espaço para o setor privado de crédito.
Em entrevista ao Valor PRO, serviço de informação em tempo real do Valor, o diretor de Planejamento do BNDES, João Carlos Ferraz, afirmou que as políticas operacionais do banco – alteradas em janeiro – já dão o norte para a mudança na composição dos financiamentos. Para Ferraz o “cenário ideal” para o futuro é ter maior participação do banco em financiamentos de risco mais elevado, e em áreas onde não há interesse do privado.
“Uma das fontes de solidez e efetividade do banco é o fato de ele ter porte e instrumentos variados de operação. Ter escala e escopo contam em qualquer indústria financeira, e devem ser mantidos. A composição do que nós fazemos é que vai mudar. Pode ser que onde os retornos são mais claros para o setor privado, nossa participação seja menor, e pode ser que a gente evolua, e acho que já está acontecendo isto, na crescente participação em infraestrutura”, disse.
Segundo Ferraz, a evolução deve ocorrer dentro das áreas também. “Infraestrutura, de 2005 para cá, apoiava hidrelétricas, depois eólicas. A nova fronteira é a solar. Na logística, vai de rodovias, aeroportos e portos a ferrovias. Na infraestrutura urbana testamos saneamento, mas provavelmente mobilidade será maior para depois migrar para outras áreas”, afirmou.
A mudança na composição dos financiamentos do BNDES é lenta, em função do porte do banco, e é influenciada pela conjuntura econômica. “Tínhamos planejamento muito forte de abrir espaço para o setor privado [de crédito]“, afirmou Ferraz. “Continuamos com isso, mas não podemos nos negar a ver que o setor privado pode ter dificuldades, que [precisem ser mitigadas pelo banco] dado a ausência de outras fontes de apoio.”
Sobre as operações diretas do banco, ele afirma que a maior parte das atividades do BNDES continua. “As áreas de operações diretas já estão contratadas, estou começando a olhar 2016. Mas é preciso estar atento em como mitigar os desafios que estão se colocando agora. A perspectiva que se tinha do investimento está caindo muito em relação ao início do ano”, disse Ferraz.
“Isso acontece em um ambiente onde, dados os compromissos assumidos pelas autoridades de Brasília, da solidez do fiscal, da inflação, o banco está operando em um espaço limitado”, afirmou o executivo, em alusão aos compromissos assumidos pelo governo e pelo Ministério da Fazenda de reduzir gastos.
Além do fator econômico, a mudança na composição do BNDES sofre influência do desenvolvimento brasileiro, um processo “cheio de tensões, desequilibrado”. “Veja toda dificuldade para colocar de pé agenda de infraestrutura. As dificuldades não são só públicas, [e vêm] de um sistema democrático onde as operações têm que estar abertas, onde a dimensão ambiental, das minorias, as licenças de operação passam pelo escrutínio de instituições de naturezas diferentes, onde as empresas do setor privado têm um balanço que precisa ser fortalecido, e obviamente vão querer uma taxa mais alta com risco menor, e não querem dar garantia”, observou.
Apesar da colocação, Ferraz está “tranquilo e esperançoso” em relação as concessões de infraestrutura que estão sendo realizadas pelo governo através do Programa de Investimentos em Logística (PIL). “Os sinais que temos são de taxas de crescimento importantes nos projetos, na demanda por financiamento e no apetite dos investidores pelas debêntures. Começa a haver um mercado secundário de compra e venda dos papéis [de infraestrutura]. Esta é uma agenda de 10, 15, 20 anos”, afirmou.
Sobre os comentários de que o setor privado estava avaliando como baixos os retorno dos investimentos em infraestrutura, Ferraz minimizou. “Se você é um investidor, é óbvio que você vai querer a maior taxa de retorno e o menor nível de garantia”, disse.
Sobre os bancos privados, afirmou que o desafio é de outra natureza. “Nós ainda dependemos de funding nas condições TLJP [taxa de juros de longo prazo, hoje em 5%] ou FGTS que amplamente são o que alimentam os bancos para que eles operem”. O desafio, segundo ele, é como ampliar o lado passivo e ativo destes bancos, hoje “muito curtos”. Ferraz afirma que isto vai começar a mudar quando cada um dos brasileiros sair da lógica do Certificado de Depósito Interfinanceiro (CDI, referência para aplicações atreladas aos juros básicos).
Os repasses do BNDES para bancos privados financiarem infraestrutura também estão fluindo bem, afirma. “Apesar de estar em ano de eleição ainda foram lançadas algumas chamadas, o importante é manter ao longo do tempo”. As debêntures de infraestrutura, segundo Ferraz, devem começar a entrar nos projetos do PIL já leiloados em uma fase mais avançada, “quando os investidores possam ver que os recebíveis estão próximos”. “A gente ainda conseguiu desenhar esquemas de ‘cross default’, de vencimento cruzado, para minimizar os riscos de emissores de títulos. Há toda uma arquitetura sendo desenhada, do nível de participação em uma linha de crédito tradicional, ao desenho de fundos com previsibilidade de lançamento de dois ou três anos ou aos financiamentos de infraestrutura, para atrair o investidor privado”, explicou.
Em sua avaliação as demandas por investimentos de risco ou de infraestrutura são tão reprimidas, que as taxas de retorno são muito atraentes. E citou a evolução da indústria de fundos, antes limitada a “equities” (ações), agora se diversificando para fundos de venture capital (capital de risco) e capital semente.
Em 26 de junho teve fim o prazo dado pelo BNDES para envio de propostas de gestão para Fundos de Investimento em Participação (FIP), para setores ligados a infraestrutura, base tecnológica, educação, saúde, economia criativa e fundo de fundos. O percentual máximo de participação da BNDESPar no patrimônio comprometido pela primeira emissão de quotas de cada fundo será de 40% para Venture Capital e 20% para Private Equity.
“Queremos ser gestores de fundos de inovação e infraestrutura onde a participação do BNDES seja pequena. Provavelmente nos fundos associados à inovação o BNDES terá que colocar mais recursos, e nos fundos com estrutura empresarial já feita, que vão investir em empresas que já têm contratos de longo prazo firmados, pode ser que o setor privado entre mais”.
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