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Oito coisas que todo mundo deveria saber sobre a China

por: Afonso Bazolli
em: Gestão
fonte: Endeavor
24 de novembro de 2020 - 17:00

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Recentemente, participei de uma missão Endeavor, que contou com sua diretora geral Camilla Junqueira e ilustre presidente do conselho Fabio Barbosa, para a China, organizada pela Startse. Passei um pouco mais de uma semana no país, visitando Pequim, Shangai e Hangzhou.

No meio da viagem, achei que estava entendendo tudo. Até que, no último dia, um francês que mora na China há dez anos me disse:

Com uma semana, você conhece a China, com um mês, você tem uma opinião sobre a China e, com um ano, você percebe que não sabe nada sobre a China.

O país é gigante e a cultura milenar. Os chineses alegam que são a única civilização continuada do mundo há mais de cinco mil anos. Realmente, sei muito pouco sobre a China. De qualquer forma, compartilho neste artigo as oito coisas que acredito que todos deveriam saber sobre esse império oriental.

1. A China “sempre” foi a potência mundial

A gente estuda muito pouco sobre a história da China nas escolas no ocidente. Herança ainda de nossa colonização, já que estudamos as grandes conquistas dos países do chamado continente velho e a antiguidade de Egito e Grécia. Me espantei quando vi um gráfico que mostra que a China, desde o nascimento de Cristo, teve a maior geração de riqueza do mundo até o século XIX. Uma guerra marcou essa mudança: a guerra do ópio de 1839.

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O império chinês tentou impedir o comércio de ópio da Inglaterra aos chineses, ao perceber como aquela droga estava acabando com sua população. A guerra foi sangrenta. Apesar de a China ter sido a civilização que inventou a pólvora, não tinha sido inserida na revolução industrial europeia e, portanto, tinha evoluído menos seu poder de fogo. Para não ser totalmente dizimada, fez um acordo com a Inglaterra, cedendo algumas regiões portuárias, entre elas Hong Kong, problema que persiste até hoje. Depois dessa derrota, ainda houve algumas outras batalhas não bem-sucedidas contra o Japão. Isso marcou os anos entre 1839 e 1949 como o século da humilhação chinesa, levando a população a miséria extrema.

No século XX, até a década de 90, a China era uma das populações mais pobres do mundo inteiro, comparada ao patamar dos países mais pobres africanos que ainda hoje persistem na miséria.

Uma das tragédias, entre tantas, que marcaram a população foi a grande fome chinesa entre os anos de 1958 e 1961, período em que, devido a péssimas políticas econômicas do Governo, priorizando a revolução industrial tardia do país, faltou alimento para milhões de pessoas. Não se sabe quantas dezenas de milhões de pessoas morreram nessa época. Fato é: isso é muito recente e ainda influencia a cultura do país.

Quando Deng Xiaoping assumiu em 1978, depois da morte de Mao Zedong, decidiu abrir a economia socialista do país e investir em estruturas fabris. Com muita mão de obra extremamente barata, a China se tornou a fábrica do mundo, responsável por 10% de toda a produção global. Com isso, o PIB do país começou a crescer e também sua renda per capita.

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2. De fábrica do mundo para referência em tecnologia

Em 2013, o presidente Xi Jinping entendeu que o país precisava investir em tecnologia para se tornar uma nação competitiva para o futuro. Começaram a combater a pirataria –  centros comerciais foram fechados pela polícia – e a corrupção, com milhares de pessoas desaparecidas. Decidiram apoiar alguns setores que iriam viabilizar essa mudança no país, entre eles a Inteligência Artificial. A China tem o objetivo de ser potência mundial nesse tema até 2030.

De fato, escolheram apoiar quatro empresas que já estavam fazendo um bom trabalho nessa área: Alibaba, Tencent, Baidu e Iflytek. Essas empresas têm todo o apoio necessário do Governo e o compromisso de manter a sua tecnologia aberta a outras empresas chinesas, assim criando um ecossistema diferenciado e valioso no país.

Enquanto o ocidente está implementando leis bem rígidas de proteção de dados, o famoso LGPD, com multas bilionárias para empresas que têm utilizado inteligência artificial com os dados de seus usuários, as empresas na China possuem praticamente todos os dados de seus usuários e nenhuma regra para seguir.

Existem em torno de 400 milhões de câmeras espalhadas pelo país e, com tecnologia de reconhecimento facial, é possível identificar cada pessoa na rua. Como todas as empresas compartilham seus dados com o Governo, o estado consegue controlar a vida da população, garantindo que sigam as regras do país. Há o benefício da segurança pública, com milhares de criminosos sendo pegos por essas câmeras e, claro, uma ordem maior, com o trânsito também controlado por meio delas. Se você, como pedestre, atravessar o sinal fechado na rua, uma foto sua é retirada e, em breve, você receberá uma multa na sua casa. Porém, com isso, perde-se o conceito que conhecemos como privacidade.

Os chineses vivem num grande big brother. Isso facilita também o controle do Partido do Estado que, com todas as informações em mãos, consegue conter qualquer iniciativa contra o seu poder.

Visitamos a Megvii em Pequim, umas das empresas que desenvolve a tecnologia de reconhecimento facial e atende, entre outros clientes, ao Governo. É impressionante a escala que eles aplicam essa tecnologia. Vistamos também a Dahua, empresa com 16 mil funcionários, faturamento de 3,5 bi de dólar por ano, um dos maiores produtores de câmeras do mundo, com tecnologia avançada para monitorar toda uma cidade, de dia e de noite.

3. O papel do Governo no China

O papel do Governo na China é fundamental para a evolução do país. Nos últimos 30 anos, presenciamos a maior ascensão social da humanidade. Foram mais de 700 milhões de pessoas saindo da zona da miséria, definida pela ONU como renda de 1,90 dólares por dia.

Não sou um defensor de seu modelo comunista. Porém, acredito que dificilmente um país conseguiria crescer tão rápido na ausência do Estado atuando ativamente na política econômica.

Nasci no vale do aço, interior de Minas Gerais, e vi as siderúrgicas da região perderem mercado e se encolherem absurdamente. No outro lado do mundo, na China, entendi o porquê. O Governo de lá criou um parque industrial para as maiores siderúrgicas do país operarem arcando com todo o custo de energia elétrica, um dos maiores custos do setor. Esse incentivo possibilita um preço imbatível na competição global.

A maior empresa do país, Alibaba, começou com um apoio crucial do Governo. Jack Ma, o homem mais rico – e muitos dizem que mais admirado até do que o atual presidente – trabalhou no ministério de comércio exterior da China antes de fundar a empresa. Um ser genial, sem dúvidas, ao ver a internet nos EUA, começou em 1995 a desenvolver sites para que companhias locais conseguissem vender produtos online para o exterior.

Fator decisivo para mudar a história da sua vida, da empresa e do país. Quando o Yahoo, maior empresa de tecnologia na época, no começo dos anos 2000 quis entrar na China, o Governo exigiu que, para terem operação no país, precisavam escolher uma empresa chinesa e investir 1 bilhão de dólares para um valuation de US$ 5 bilhões.

Alibaba foi a escolhida e, hoje, é a maior empresa do país, valendo mais de US$ 400 bilhões na bolsa de Nova York.

Não acho que o Governo escolhe um sortudo para ser apoiado. O que me pareceu é que ele escolhe alguns setores da economia como prioridade e, se o seu negócio é uma das maiores empresas desse setor, terá privilégios. Acredito que a competição entre as empresas para se destacarem é bem acirrada. É um mercado que as pessoas têm como prioridade máxima o trabalho, com o famoso regime 9-9-6 (trabalho de 9 da manhã às 9 da noite, 6 dias por semana, de segunda a sábado).

A grande maioria da população ativa chinesa atual precisa trabalhar insanamente, pois sustentam a sua família e de seus pais. Com a política do filho único que durou por cerca de trinta anos no país, o padrão da sociedade é os jovens se casarem e levarem os pais, tanto do homem quanto da mulher, para morarem todos juntos. Isso quando conseguem se casar, uma vez que existem quarenta milhões mais homens do que mulheres – legado também do período de filho único, quando os casais privilegiavam o nascimento dos meninos que tinham mais força para o trabalho rural, provavelmente sacrificando as meninas. Assim, atualmente o casal precisa sustentar seus filhos, a si mesmos e aos avós da casa.

A responsabilidade de criação das crianças da casa é dos avós, enquanto os pais passam mais de 70 horas por semana no trabalho.

Outro tema que é prioridade para o Governo atualmente é o Blockchain. Conhecemos um francês que tem uma empresa que atua com essa tecnologia. Ele tem subsídios como o aluguel em região bem cara da cidade bancado pelo Estado. Portanto, também estão incentivando empreendedores estrangeiros, caso atuem na área de interesse do Partido, a terem suas empresas na China. Em troca, o Governo precisa ter acesso a toda sua tecnologia.

Assim, os chineses aprendem com o resto do mundo sobre os temas que acham importantes e se preparam para dominar o planeta.

5. As empresas chinesas não são globais ainda

Durante a nossa viagem, visitamos a muralha da China e aprendemos sobre a sua importância para o país manter uma civilização tão grande e unida por tanto tempo. Foram mais de 21 mil quilómetros construídos em quase 2.000 anos, protegendo o povo chinês de serem invadidos por bárbaros da região.

De certa forma, acredito que a história esteja se repetindo. Agora a muralha é virtual, the great firewall. O Governo chinês construiu uma barreira online que não permite que as pessoas acessem diversos sites e apps estrangeiros. Assim, filtram toda a informação que chegam até seu povo e, ainda mais importante, bloqueiam as grandes empresas americanas de entrarem e dominarem o mercado chinês.

As pessoas na China não têm acesso à Amazon, o que possibilitou o Alibaba e JD.com crescerem tanto. Não têm acesso ao Google e Youtube, possibilitando o Baidu e o Youku, nem ao Facebook, Instagram e Whatsapp, dando espaço ao Wechat da Tencent e ao novo meteoro chinês chamado TikTok, nem ao Netflix, tendo o QIY. Provavelmente, tem outros exemplos que esqueci ou não tive conhecimento. Para que eu conseguisse acessar qualquer um desses sites, precisei contratar um serviço de VPN para utilizar um IP do exterior ou usar o meu chip brasileiro com roaming internacional, duas opções que não funcionavam tão bem de lá.

Modelo de Cópia chinês

Não há dúvidas que a “muralha virtual” foi crucial para o desenvolvimento dos gigantes chineses de tecnologia. Se engana quem acredita que eles apenas copiam os modelos das grandes americanas. Era-se o tempo em que a China fazia apenas o “copiar e colar”. Isso ainda existe, é verdade, até um McDonald’s falso, com o mesmo M da marca americana, eu vi numa estação de trem. Porém, eles foram aperfeiçoando seu modelo de cópia, conforme abaixo.

A inovação também está a caminho, conforme vocês verão mais pra frente nesse artigo.

Independente dos meios para se chegar lá, as empresas chinesas conseguiram dominar o seu mercado interno. Atualmente, existe um grande monopólio no país entre o Alibaba e a Tencent, juntas, são responsáveis por 90% de todas as compras via mobile do país (via Alipay e Wechat) e 50% de todo investimento de capital de risco em empresas chinesas.

Portanto, não há dúvidas da competência de suas empresas para crescerem em seu país.

Fica a dúvida: será que as empresas chinesas terão sucesso no exterior?

Uma coisa que me espantou é como as empresas que visitei tem suas receitas predominantemente da China.

Mais de 90% de toda a receita do Alibaba vem dos compradores chineses. A gigante chinesa tem como meta alcançar dois bilhões de clientes e empregar, juntamente com seus parceiros, cem milhões de pessoas até 2036. Planejam sobreviver três séculos, o que seria alcançado com 102 anos, uma vez que foram fundados em 1999. Durante uma visita em sua sde, citaram que viram o Yahoo, que era uma das maiores empresas de tecnologia do mundo no começo deste século, quase desaparecer e, com isso, os executivos aprenderam que a chave do sucesso no longo prazo é não trabalhar apenas pelo negócio, mas, principalmente, pelos sonhos. Acreditam que a força da sua cultura está na premissa de que as pessoas devem trabalhar felizes, colocando o cliente em primeiro lugar. Outro pilar importante é a crença de que a única constante é a mudança, só assim será possível alcançar o diferencial para a vida longa.

Nessa mesma conferência, disseram também que almejam ser uma empresa global e não apenas internacional. A diferença seria a forma como se adaptariam a cada região de atuação. Porém, os números mostram que isso é mais um sonho do que realidade no momento.

O Wechat é utilizado basicamente apenas na China, como você pode ver no mapa abaixo. Recentemente, até proibiram o acesso ao app por estrangeiros. Alguns dizem que essa medida foi para eliminar as fraudes. Como os estrangeiros não estão inseridos no mercado financeiro da China, a empresa não possui dados suficientes para confiar o crédito. Outros acreditam que essa foi uma medida ordenada pelo Governo para que evitasse a comunicação excessiva entre pessoas da China e o ocidente. Não sei qual a verdade ou se foi um pouco pelos dois motivos. Fato é que o Governo tem acesso a todas as conversas no aplicativo. E o administrador do grupo responde pelas ações de todos do grupo. Assim, se alguém fala mal do Partido em algum grupo, não apenas o administrador retira a pessoa na mesma hora, como algumas pessoas saem do grupo com medo.

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Na China, a utilização do WeChat é absurda, com mais de um bilhão de usuários. Cerca de 50% acessam todo dia por mais de 90 minutos. Já tentaram internacionalizar com grande campanha publicitária, tendo o Messi como garoto propaganda, porém, não tiveram sucesso.

A Ctrip, segunda maior empresa de turismo do mundo, também conta com mais de 90% de sua receita vinda de clientes chineses. Começou recentemente sua marca global, a trip.com, ainda engatinhando. Também, os chineses são os que mais viajam ao redor do mundo. Eles gastam em torno de 250 bilhões de dólares por ano, enquanto os viajantes americanos gastam fora de seu país menos de 150 bilhões.

Sou curioso para ver como será os próximos passos das empresas chinesas ao tentar dominar mercados exteriores. Dizem que é possível ver essa guerra entre grandes empresas do ocidente e chinesas no mercado do Vietnã. Lá, teoricamente, coexiste Uber e Didi, Whatsapp e Wechat, Amazon e Alibaba. Bom, nunca fui para conferir.

Achei interessante também alguns casos de empresas novas que já nasceram pensando no exterior. Isso acontece quando chineses que fazem MBA no exterior voltam para empreender em seu país. Achei legal como, mesmo com um mercado local extremamente grande, a Fintopia, startup de empréstimo entre pessoas comuns a partir de inteligência artificial, já em seu segundo ano, expandiu suas operações para a Indonésia. Nesse momento, está começando sua operação no Brasil.  A Mintech, outra fintech de análise de crédito para empréstimos, com apenas três anos de vida, já tem um escritório no Brasil. Vamos ver se essas empresas novas conseguirão sucesso nessa empreitada internacional.

6. Não se engane, não é apenas escala

Sim, só é possível criar esses impérios atendendo apenas ao mercado doméstico dado o tamanho da população do país. Muitas vezes, achamos que tudo na China se justifica pelos 1,4 bilhões de habitantes. Quando analisamos os números mais de perto, vemos que talvez não seja bem assim.

A população da China é por volta de 7x maior que a do Brasil.

Atualmente, forma-se por volta de 4,7 milhões de profissionais de tecnologia (na verdade, os chamados STEM: Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática). É o maior de todo o mundo, conforme abaixo.

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Se o Brasil fosse seguir a proporção dos tamanhos da população, deveríamos ter quase 700 mil alunos formando nesses cursos todo ano. Na prática, segundo a BRASSCOM e a Softex, o Brasil pode chegar em 2020 com um déficit de 750 mil profissionais qualificados para atuar na área de tecnologia. E segundo o que me disseram, não temos nem 50 mil formados no setor.

Para todo número que vemos da China, é necessário aplicar a regra de três para ter a real noção de seu tamanho.

Como exemplo, o número de unicórnios – empresas privadas com valuation acima de um bilhão de dólar, a China tem um pouco mais de 200 unicórnios. Logo, o Brasil deveria ter por volta de 30, porém, ainda não chegamos a 10.

Algo diferente está acontecendo ali. Não é apenas o tamanho, mas é a velocidade que impressiona. Nos EUA, se demora em média sete anos para uma empresa virar unicórnio, enquanto na China está em apenas quatro anos.

Até 2008, a única linha de trem bala na China era um pequeno pedaço que ligava Beijing a um dos locais das olimpíadas de 2008. Hoje, ela tem mais que o dobro quilômetros de trilho do que todo o resto do mundo junto.

Alguns casos são tão bizarros que, a meu ver, parece ser uma pirâmide que vai despencar, como o caso da LuckinCoffee. Em menos de três anos, eles foram do zero ao IPO e valem, hoje, quase cinco bilhões de dólares na bolsa de valores. Nunca tiveram lucro. Só em 2018, foram 116 milhões de dólares de prejuízo. São uma cópia do Starbucks, porém, com preços mais baratos. Atualmente, eles já ultrapassaram a incrível marca da concorrente de 3.600 unidades na China, chegando a quase 4.500 lojas. Eles conseguem crescer com promoções constantes de café bem barato. Não sei se eles têm alguma estratégia que lhes garantem um menor custo ou se têm uma qualidade incrível que, quando subir o preço, seus clientes se manterão fiéis. Se não for um dos casos, acredito que, em algum momento, o mercado vai entender que não terá outro investidor para pagar mais caro em algo sem capacidade de gerar lucro. Aí os últimos investidores perderão bilhões.

Seja como for, casos como esses acabam inspirando os jovens chineses a criarem suas empresas para terem sucesso. Passa a mensagem que é possível subir de vida, num país que, há poucas décadas, a luta era por comida. Imagina você começar uma empresa e depois de três anos ser um bilionário?

É verdade que a velocidade de crescimento do PIB da China vem diminuindo. Ainda me parece um ritmo muito acelerado para uma economia que já representa 15% da economia global. Para se ter uma noção, estima-se que a China vai representar 35% de todo crescimento global dos últimos três anos.

Toda essa velocidade e escala comprovam como a China é o melhor país do mundo para fazer a jornada de um a cem, ou seja, pegar algo que já existe e crescer exponencialmente. Porém, eu vi poucos casos chineses de sucesso de inovação do zero, ou seja, do zero mesmo a um não seria a expertise deles.

O único modelo de negócio que nasceu na China e se espalhou para o mundo que eu vi foi o de aluguel de bicicletas pela cidade. A OFO, que acabou exagerando em sua estratégia de expansão sob uma operação deficitária e acabou quase falindo, supostamente, foi o primeiro a operar esse modelo em Pequim. Depois a mobike copiou na própria China e a Meituan (maior app de delivery de comida da China) comprou. Não sei se sua operação é lucrativa atualmente, mas ter lucros não é algo que está tão na moda. De qualquer forma, seu modelo foi copiado pela Lime nos EUA e pela Yellow e Grow no Brasil.

Acredito que devam existir outros casos parecidos, mas, mesmo se não houver ainda, acho que é questão de tempo. É preciso lembrar que tem apenas sete anos que o novo presidente assumiu e priorizou a diretriz de tecnologia. Em número de patentes, a China já é o país campeão mundial com 928 mil, enquanto EUA têm 578 mil. Acredito que, com todo o investimento em inteligência artificial das empresas chinesas, apoio do governo e excesso de recursos humanos e de capital, a China deve virar o berço da inovação tecnológica do mundo. Um indício disso é o polêmico caso da Huawei que, supostamente, desenvolveu a melhor tecnologia de internet 5G, que vai nos possibilitar inúmeras outras coisas dadas a sua velocidade e qualidade extremamente superiores (imagina você baixar um filme inteiro em 3 segundos).

O que a mídia diz é que os EUA estão barrando os países de adotá-la, evitando a hegemonia chinesa.

Acho que existia uma demanda reprimida por muito tempo no país e, com o aumento recente da renda média da população, as oportunidades são potencializadas. Em alguns setores, a China está pulando etapas e passou na frente de todo o mundo, como no mercado financeiro. A adoção absurda de pagamentos via QR Code pelo celular – já com penetração em 97% dos jovens e 47% dos idosos do país – é fruto desse salto do retrocesso para o futuro. Há poucos anos, o serviço bancário na China era quase inexistente, o que impossibilitava a expansão dos cartões de crédito. Assim, quando a opção de pagamento via celular apareceu, se espalhou muito rápido, enquanto nos países do ocidente, o mercado encontra a barreira das grandes bandeiras de cartão mantendo o seu mercado.

Com ainda 40% da população em área rural e renda per capita 6x menor do que os EUA, o mercado interno chinês ainda tem muito para crescer.

Importante citar que, como os próprios especialistas dizem, os números na China não são precisos. A falta de transparência das autoridades e volume de pessoas fazem com que nos deparemos com alguns números diferentes. No entanto, não me apeguei a exatidão e, sim, ao conceito por trás deles.

7. A China vai dominar o mundo?

Se você colocar as projeções de crescimento atuais num gráfico, verá que o PIB da China deve passar o dos EUA em 2030, virando a maior economia do mundo. Lógico que os EUA terão uma década para reagir e vão tentar, claro. Aliás, as sanções comerciais que preocupa todo o mundo estão em alta. Acredito que não tenha como segurar. Afinal de contas, a China vai apenas voltar ao lugar que sempre foi seu na história, com exceção do século XX, de maior economia do mundo.

Agora, será que ela vai dominar outros países não apenas economicamente, influenciando as suas políticas internas e transmitindo a sua cultura? Será que, daqui algumas décadas, todos no mundo terão que falar chinês ao invés do inglês se quiserem se aventurar em terras internacionais?

Se você analisar a história da China, ela nunca foi de colonizar outras civilizações. Sempre se viram como centro do mundo. Não à toa o nome da China, em chinês, é Zhongguo (zhong – meio; guo – país) que quer dizer “país do meio” e a capital do norte se chama Beijing (bei – norte; jing – capital) e a do sul Nanjing (nan – sul; jing – capital). Fato é que sua influência ao redor do mundo aumenta a cada dia. Apesar de seu poder bélico ser ainda aquém dos EUA, com orçamento militar chinês de 150 bilhões de dólares contra 600 bilhões dos americanos, esperamos que não seja preciso uma guerra para barrar a China.

O poder econômico determina tendências em vários países. Muitas vezes, o que a China diz que quer comprar vira prioridade de várias nações. Acredito que, até os filmes americanos começarão a sofrer essa influência. Atualmente, alguns filmes geram mais receita na China do que no resto do mundo. O Governo chinês permite apenas 36 filmes entrarem em seu país por ano, os quais devem passar por sua análise crítica. Acho que muito diretor de Hollywood vai querer adaptar seu roteiro para fazer parte dessa festa.

Vemos também o crescimento de investimentos de empresas chinesas ao redor do mundo. A compra da Skyscanner pela Ctrip por mais de um bilhão de dólares surpreendeu o mundo. Marcas estrangeiras consagradas também passaram para as mãos dos chineses, como a sueca Volvo e a italiana fabricante de pneus Pirelli. O Brasil não está fora. A Tencent investiu no Nubank, de olho nos milhões de usuários do banco digital.

Um assunto que está em alta é a rota da seda, projeto do governo chinês que vai financiar infraestrutura para conectar o mundo, investindo em portos e ferrovias de diversas nações, conseguindo vantagens em troca.

Por fim, se a Huawei conseguir ganhar a guerra da internet 5G, imagina o mundo inteiro usando uma internet que o Governo chinês tem acesso e utiliza os dados indiscriminadamente?

8. O que vai acontecer quando as prioridades da população chinesa mudarem?

Entendendo todo o histórico, se compreende como o Partido atual que está no poder desde 1949 tem aprovação popular. Num país onde a prioridade da maioria da população é sobreviver à fome, ficam em segundo plano a perda de privacidade e a privação de informação e serviços globais. Com o aumento da renda da população, será que esses outros pontos tão valorizados pelo ocidente começarão a ser um desejo do povo chinês? Se for, será que o Partido conseguirá manter a ordem e submissão de sua nação com mais de um bilhão de pessoas depois dessa ascensão social?

Shangai com seus arranha-céus, que para mim pareceu um pedaço dos EUA dentro da China, já está mudando.

Conversamos com uma empreendedora brasileira há mais de cinco anos na China que nos contou como as leis trabalhistas ali eram como as do Brasil, se não mais restritas. Ela nos disse, ainda, que a maioria dos jovens que tem contratado já vem de família rica chinesa, que não quer trabalhar, se frustra facilmente e decide fazer um ano sabático. Disse que o judiciário privilegia os empregados de tal forma que ela, raramente, demite um funcionário e quando o faz o paga três meses de salários na rescisão para evitar que ele vá a justiça. Para ela, não existe o 9-9-6 chinês.

É um paradoxo muito grande, pois, na mesma cidade, eu pude presenciar um evento social que condiz com outra realidade que me marcou. Fomos na Praça do Povo no sábado e vimos centenas de idosos sentados atrás de um guarda-chuva com a foto e descrição de jovens homens e mulheres pregada nos seus respectivos guarda-chuvas. Eram os pais tentando achar uma pessoa para seus filhos se casarem. Nos folhetos, diziam suas idades, trabalho, renda  etc. Alguns exibiam, outros passavam analisando. É uma espécie de Tinder off-line. Como os filhos precisam trabalhar muito para sustentar a casa, não tem tempo de procurar um par. É muito importante para a família que eles se casem, uma vez que são praticamente todos filhos únicos. Assim, eles agendam encontros entre os jovens que se conhecem e decidem se seguem com a escolha de seus pais (pelo o que entendi o jovem pode escolher sim se deseja de fato casar com a escolhida ou não e vice versa).

Na mesma cidade, vemos realidades muito diferentes. Fica difícil imaginar como a sociedade vai reagir há tantas mudanças em um intervalo tão curto de tempo.

O texto ficou longo e daria para escrever muito mais. Aliás, para quem quiser se aprofundar, recomendo o livro “O Poder da China” do Ricardo Geromel.

Você pode ter estranhado o fato do artigo pular o item 4. Ir à China é um pouco disso, você se estranha com quase tudo que se vê. Quatro é o número do azar na cultura chinesa, com sonoridade parecida com a palavra morte, então, decidi pular. Mesmo assim, decidi manter as “Oito coisas” no título para desejar boa sorte a todos em nosso país. Não será fácil competir com tamanha potência. Óbvio, oito representa sorte na cultura chinesa.

Por fim, agradeço por todo o carinho da equipe da Startse e Endeavor. A missão foi sensacional.

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